segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Criacionismo? Design Inteligente? Isso não é ciência

Por Adelson Vidal Alves



O mundo tem pouco mais de 6000 anos, os fósseis são vestígios de espécies extintas no diluvio universal, o homem foi criado exatamente como ele é, não sofreu qualquer evolução. Eis o que defende o criacionismo. Tese bíblica para explicar a origem do mundo e da humanidade. Absurdo? Não. Desde que ela fique dentro das igrejas, pregada como uma hipótese teológica, baseada exclusivamente na fé.

No entanto, ainda hoje vemos cientistas de boa formação acadêmica que defendem o criacionismo como ciência, e pior, que deve ser ensinado nas escolas como alternativa ao evolucionismo. Os alunos deveriam aprender a teoria da criação e da evolução, e escolher entre as duas em qual acreditar. Parece democrático, mas é na verdade uma distorção bizarra do sentido escolar e científico.

É simples: o método cientifico se caracteriza pelo experimento. Ao se investigar um objeto, colhem-se fontes, elaboram-se hipóteses e testam-se todas elas, por várias vezes, até que se chegue a uma conclusão segura. O criacionismo faz caminho inverso. Ele parte de uma conclusão, a de que Deus criou o mundo exatamente como narram os textos bíblicos. Os fósseis, os testes genéticos, os cálculos da física são todos manipulados para provar a verdade pré-estabelecida. Isso não é ciência.

A ciência evolucionista não tem todas as respostas sobre todo o processo que gerou o cosmos e a vida no nosso planeta. Que bom que não tenha, isso mostra que é uma ciência séria. Mas ao contrário do criacionismo, a teoria fundada por Darwin goza de fontes abundantes nos fósseis, na observação do mundo natural, nos testes genéticos, e por ai vai. Que evoluímos é um fato. Os detalhes ainda estão para serem descobertos. Como colocar uma ciência rigorosa ao lado de um sistema de pensamento mítico, como se os dois tivessem validade científica?

Todavia, os criacionistas evoluíram neste debate (ironia, não?). Desacreditados pela academia, eles resolveram dar um rosto não tão escancaradamente religioso a sua teoria. Falam agora de “design inteligente”, uma moda forte nos EUA. Os novos criacionistas preferem organizar sua “ciência” para comprovar que o mundo que temos atualmente comprova ordem, harmonia, e estética dignas de um criador inteligente. Tanta beleza poderia vir do acaso? Não seria uma hipótese razoável admitir uma força organizadora ao invés de atribuir a complexidade da vida a um acidente cósmico e mutações casuais? Perguntam eles. 

Bem, o cientista pode acreditar que há uma força que organizou o universo que ele estuda, mas não pode, jamais, incluí-la em suas hipóteses, pela simples razão que não terá como prova-la. Os cientistas do design inteligente querem um Deus criador para poder sustentar reflexões sobre um mundo vigiado por um ser superior. A ciência não precisa disso. Ela deve investigar as coisas como aconteceram, e não por qual sentido aconteceram. Isso é coisa pra filosofia e para a teologia.

Além do mais, a ideia de um cosmos em ordem, simétrico, belo e interligado não é consenso científico. Grandes cientistas como Albert Einstein e Stephen Hawking creram ou creem em uma “teoria do tudo”, uma espécie de código natural da física que explicaria por completo tudo que existe. Há quem discorde, como o físico brasileiro Marcelo Gleiser. Em seu livro “a criação imperfeita” ele tenta demonstrar que o mundo natural que vivemos testemunha assimetria, caos e desordem, e que a vida que conhecemos só foi possível graças a erros no funcionamento natural das coisas. Se não há a interligação defendida por cientistas unificadores e místicos, jamais encontraremos uma teoria final.

Mas este é um debate científico, o criacionismo e o design inteligente nada ajudam Ao contrário, deveríamos, de uma vez por todas, entender que a fé tem seu lugar no mundo, até pra explicar de forma simplista o que é complexo, desde que fique longe dos laboratórios e das aulas de ciências.



quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Qual o sentido da vida?

Por Adelson Vidal Alves



Como todos sabem, sou materialista. O materialismo, de origem grega, é o pensamento que reduz a vida, a sociedade, os planetas e os seres humanos num simples aglomerado de átomos. Nesta perspectiva, a morte é tão somente a interrupção da consciência, a entrada no silêncio eterno e no vazio. Tudo isso é bem diferente da metafísica. Esta, como sugere a etimologia, crê num mundo além da matéria. A religião (parte da metafísica) geralmente crê num Deus que criou o mundo, que tem inteligência suprema e um plano para todos nós. Materialistas pensam a vida como um simples acidente cósmico, os religiosos, um cálculo ordeiro de uma inteligência celestial.

Ser materialista não é fácil. É dose saber de nossa finitude, que não temos nenhuma força superior para recorrer quando a morte se aproxima, quando perdemos o emprego, contraímos uma doença grave. E depois de tudo isso, nem um céu pra nos confortar no além-túmulo nós temos. A maioria das pessoas religiosas prefere não fazer grandes questionamentos sobre o sentido da vida. Ele está na mão de uma energia cósmica que promete no futuro coisa melhor que esse mundo furreca nos oferece.

Sim, porque nem mesmo os cristãos consideram nossa vivência um paraíso, ele ficou no Éden, e pelo vacilo de Eva, estamos aqui quebrando a cara. Pessimistas e religiosos sabem que o mundo oferta desespero, medo, tormento, angústia e tristeza, o tempo todo. Não a toa, Franscisco de Assis coloca em sua oração que a morte não é um desastre, é a abertura do portão para um mundo plenamente feliz. E quem aqui nunca disse a um ente querido que morreu: “descanse em paz”. Descansar do que? Da felicidade e dos prazeres? Não. Da dor que é a existência humana.

Dito tudo isso, materialistas e cristãos se rivalizam quanto ao fato de encontrar o sentido da vida. Materialistas sabem que ela é fruto de um acaso, não há ordem ou direção. Vivemos, morremos e pronto. Os religiosos vão falar em karmas, paraísos celestiais, missões divinas etc. Estes estão resolvidos.

Os materialistas, contudo, também precisam de algum sentido, senão estariam em hospícios ou pendurados numa forca de suicídio. Pensa-se nos prazeres, nos amigos, nas causas humanitárias, nas ideologias utópicas, no amor, no sonho de deixar um filho. Para quem não espera nada do outro lado, aqui passa a ser o céu e o inferno.

O materialismo é um ato corajoso e conformista. Nos dá a missão de encarar a pior das possibilidades humanas: não há Deus e nem uma vida futura perfeita. A postura de aceitar a finitude humana é conformação, mas também a coragem de viver com suas forças, e não jogar para nenhum deus o que a natureza caótica nos condenou como espécie.


domingo, 18 de dezembro de 2016

O estranho comportamento de Sérgio Boechat, o “Guru” de Samuca

Por Adelson Vidal Alves




O advogado Sérgio Boechat fará parte de uma espécie de “conselho de gurus” que irão orientar o prefeito eleito de Volta Redonda Samuca Silva. Ele usou sua página na internet para responder um texto meu, publicado aqui nesse mesmo blog no dia 16 de Dezembro 2016 ( Clique para ler Samuca não serve nem para populista fajuto). A reação me espantou, até porque, Boechat assinou comigo um artigo intitulado "Nosso voto em Baltazar" onde apoiávamos o então candidato Paulo Cezar Baltazar no segundo turno das eleições municipais. No artigo, compartilhamos preocupações com uma possível eleição de Samuca. Abaixo cito trechos do nosso texto:


"O momento é de crise, com perda relativa de receitas, agravada pelo “rombo orçamentário (..,) vai exigir do Chefe do Poder Executivo um conhecimento profundo de Administração Pública. Não é tarefa para amadores, para quem conhece pouco a Volta Redonda de hoje, para quem não está acostumado a fazer composições políticas, preferindo se esconder em discursos de isolamento que não combinam com a complexidade da política democrática. Não podemos, também, arriscar a cidade entregando-a a quem não tem experiência em gestão pública".

"(...)temos pouco conhecimento sobre o outro candidato e por responsabilidade para com nossa cidade, optamos por não arriscar, não dar chance para aventuras perigosas que podem comprometer a vida de nossa cidade.  A experiência de Samuca como gestor público não consta do seu currículo, exercer o cargo de Controlador não dá a ninguém credencial para administrar uma prefeitura com um orçamento de 01 bilhão de reais. Teoria apenas não resolve".  


Parece que B0echat mudou e muito de opinião, nesse caso, seria importante que publicasse em seu blog uma nota rejeitando tudo que escreveu comigo naquele artigo. Além do que, seu comportamento estranho vem junto com o fato que será nomeado assessor especial de uma pessoa em que jamais votou, talvez seja o único entre os tantos cargos comissionados que Samuca escolheu. Mas vamos ao que ele escreveu.

Ele inicia sua defesa do prefeito eleito dizendo que desconheço pesquisas recentes. Ora, o que isso tem a ver com o que escrevi?  No meu artigo trato do perfil de Samuca e de algumas hipóteses sobre sua surpreendente eleição. Boechat nega que Samuca tenha feito propostas tecnicistas e neoliberais. Ele fez e muito isso: Quando defendeu o enxugamento do Estado, sinalizou para as diretrizes do livre mercado, quando se cercou de empresários e quando tagarelou a lorota de que o problema dos governos é tão somente a falta de um gestor. Samuca não é um liberal consciente, provavelmente jamais leu John Locke, Adam Smith ou David Ricardo. No entanto, o liberalismo aparece em sua visão de sociedade.

O “guru” de Samuca também fala que a vitória do novo prefeito se deu em cima de um projeto e de uma boa comunicação com o povo. Conversa fiada. O candidato do PV renegou as diretrizes programáticas do seu partido, não tocou, ou tocou pouco, nos temas obrigatórios a sua filiação verde, sobretudo o ambientalismo e o desenvolvimento sustentável. De olho nos votos conservadores, foi contra o que defende o Partido Verde no que toca ao aborto e a legalização da maconha. Resumiu-se apenas em falar que era o “novo” e “gestor”. Isso lá é projeto?

Boechat exagera quando exalta as qualidades de comunicador do candidato. Quem acompanhou a campanha eleitoral viu que Samuca não tinha domínio nem mesmo de seus apoiadores mais aloprados, que produziram charges debochando de adversários. Quando fugia dos debates alegando outros compromissos, o ingênuo candidato transmitia ao vivo pela internet reuniões que fazia em seu comitê no mesmo horário em que poderia estar debatendo com seu adversário. Nas redes sociais, ao contrário do que diz Boechat, Samuca foi atrapalhado, lhe faltando até mesmo a criatividade para um jeagle, chegando ao absurdo de plagiar a campanha do candidato a prefeito de São Paulo em 2012 Fernando Haddad. O restante da nota de Boechat é pura bajulação.

O estranho comportamento do futuro assessor de Samuca parece ser explicado pela constatação óbvia de que será esse seu papel no futuro governo: o de blindar Samuca. Nada contra, mas não deixa de ser uma grande ironia, haja vista que ele passou parte de sua vida de oposição ao prefeito Neto atacando quem o defendia.


Boechat costumava divulgar em seu blog os nomes dos cargos comissionados de Neto. Fará isso com o governo Samuca? Se fizer, terá que divulgar seu próprio nome. 

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Samuca não serve nem para populista fajuto

Por Adelson Vidal Alves



O termo populismo é um dos mais debatidos na sociologia e na historiografia. Em geral, faz referência a governos que dão as costas a partidos políticos e ao parlamento. Tem um líder carismático que utiliza comunicação direta com o povo, sempre usando de discursos impactantes, como o que trata os mais pobres como “descamisados”. O populismo é um fenômeno abundante na história da América Latina. No Brasil, teve inicio com Getúlio Vargas e foi até o governo de João Goulart, o Jango. Na Argentina, um exemplo claro de populismo é o peronismo.

Mas há quem diga que ele chegou a Volta Redonda, a partir do “fenômeno Samuca”. Claro que tal conceituação é um exagero. O prefeito eleito da cidade do aço não tem carisma, a comunicação com o povo é precária, sua oratória é fraca, está mais próximo desta moda que exalta a gestão contra a política, demonizada como o mal generalizado. O populista, de alguma forma, faz política.

Nesta semana, a câmara de vereadores aprovou a diminuição do poder de remanejamento do prefeito para 7%, um golpe na governabilidade. Muitos de seus seguidores defenderam que Samuca convoque o povo para ir às ruas contra o parlamento. Mas ele não fará tal convocação. Não tem base social, não contaminou a população a ponto de fabricar um “samuquismo”. Enfrentar os vereadores sem base social sólida seria um dos seus maiores equívocos.


Devemos ter claro que Samuca não venceu com um programa político de cidade. Mesclou (provavelmente de forma inconsciente) propostas tecnicistas e neoliberais, apresentando-se de forma messiânica. Samuca não serve nem para um populista fajuto. Sua até então improvável vitória se deu sob um vácuo político provocado pela crise da política tradicional. Ele foi empurrado para o Palácio de 17 Julho como uma forma de grito desesperado pelo novo. O próprio Samuca demorou a entender estes fatos, reagiu assustado, ganhou muito mais por conta desta onda do que por méritos próprios. 

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Por que estou deixando a REDE Sustentabilidade

Por Adelson Vidal Alves



No ano de 2013 me juntei a um grupo de pessoas para recolher assinaturas na fundação de um novo partido: a REDE Sustentabilidade. A nova legenda nascia em torno da ex-senadora Marina Silva. As eleições de 2014 interromperam esse processo, já que a REDE não conseguiu registro no TSE a tempo de disputar as eleições presidenciais. Marina acabou se abrigando temporariamente no PSB.

Em 2015 o partido é reconhecido pela Justiça eleitoral. Eu e meus companheiros do grupo de assinaturas nos reunimos para tentar organizar o partido na cidade de Volta Redonda. Fomos aconselhados a procurar os grupos que também tinham interesse em construir a REDE. Os interessados aceitaram trabalhar na formação de uma direção provisória plural, sendo orientados diretamente pelo diretório estadual. A poucos dias do final do prazo de filiação para a disputa do pleito municipal formamos nossa executiva, onde fui escolhido porta voz (presidente na linguagem jurídica do TSE). Nossa direção provisória resistiu a uma investida oportunista de pessoas que tentaram assaltar o partido para fim de interesses pessoais, saímos inteiros e obtivemos relativo sucesso com nosso único candidato a vereador. Tudo isso, no entanto, foi extremamente desgastante, me fazendo conhecer desilusões e desalentos frente a realidade do partido, a quem hoje comunico meu desligamento. As razões são de ordem pessoal e política.

De inicio admito o quanto é trabalhoso formar um partido, ainda mais com a proposta que a REDE tinha. O movimento foi aberto, acolheu variados setores da sociedade, a ideia era ser plural. Com o tempo, percebi que esse pluralismo virou sinônimo de falta de identidade, já que nunca nos posicionamos no espectro ideológico, nunca nos afirmamos como centro, esquerda ou direita, a REDE quer abraçar o mundo, de certa forma, adotando o discurso pós-moderno que proclama o fim das grandes narrativas ideológicas. O partido não é social-democrata, liberal , comunista, ou é tudo ao mesmo tempo. No centro, o discurso comum da sustentabilidade e da nova política, essa última que jamais foi devidamente conceituada, apenas de forma genérica. Convivi ao lado de neopentecostais homofóbicos, anti-comunistas, ultraliberais, gente de direita mesmo, aceita naturalmente pelo partido.

Com mais de um ano de existência, a organização partidária é precária. A disputa política é fratricida. No estado do Rio, no momento atual, assistimos a uma luta interna que mal conhecemos suas dimensões. O interior do estado sofre. As informações não chegavam a nós, mal conseguíamos nos comunicar com nossos dirigentes. A realidade interna do partido corre sem nossa ciência. Nosso deputado Molon vem a Volta Redonda fazer uma palestra, sequer uma ligação recebemos. Passei pelo constrangimento de saber do evento por um de nossos adversários políticos. Em tempos de redes sociais e comunicação rápida, nada explica tal situação, a não ser o descaso.

A REDE segue sendo uma alternativa, do qual sigo confiando que influenciará positivamente a democracia brasileira. Para isso, terá que criar um rosto, apresentar um programa coeso, equalizar suas diferenças e botar pra fora os corpos estranhos que frequentam o partido. Não há nenhum sinal de reforma significativa nesse sentido. Ao contrário, sequer conseguimos agir unificados pelo impeachment, o próprio deputado Molon nos chamou de golpistas.

Marina Silva, essa grande mulher, é o sol no qual os militantes da REDE giram em torno, virou uma santa intocável. Menos por culpa dela, mais pela passividade dos filiados. A grande maioria deles pessoas honestas e sinceras que verdadeiramente se preocupam com um mundo melhor.

Não vou ficar para ajudar nessa mudança que tantos precisamos. Falta-me força, tempo e empolgação. Seguirei, provavelmente, como um torcedor pelas transformações partidárias, mas não doarei mais meu tempo às instâncias de direção. Saio desejando sorte aos guerreiros e guerreiras que ficam e seguem acreditando no potencial do partido. Eu, aqui, despeço-me dos meus companheiros. Força a todos e muita Coragem.


sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Meus alunos estão lendo Olavo e votando em Bolsonaro. O que deu errado?

Por Adelson Vidal Alves



“Professor, você conhece este filósofo?”, perguntou-me um de meus alunos, com um livro de Olavo de Carvalho na mão. Feliz, propôs a conversar comigo sobre sua descoberta, o livro era “O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota”. A principio, fiquei preocupado, mas ele estava lendo, e isso anda raro em nossos jovens, eu deveria incentivá-lo. Ele segue em seu entusiasmo: “O senhor sabia que Obama não é americano, que o papa é comunista e que a Pepsi usa fetos abortados em seus refrigerantes?" Suas colocações sempre giravam em torno das várias posições polêmicas do “filósofo Olavo”.

Meu aluno não é uma exceção. Olavo de Carvalho tem chegado com relativo sucesso às mentes dos nossos alunos, sobretudo, os de classe média em escolas particulares. De alguma forma, ele tem sido bem mais atraente que os pensadores clássicos. Nossa juventude desconhece Marx, Weber, Foucaut, Sartre... mas conhece Olavo e vota em Bolsonaro. Sim! Essa é a segunda parte da minha preocupação.

Assim como o filósofo sem graduação em filosofia, Bolsonaro vem crescendo entre os nossos jovens. “Bandido bom é bandido morto” “A ditadura militar não dava mole para bandido e terrorista” “virou gay por falta de porrada”. Essas são as frases que vem encantando parte de uma geração. Os admiradores do “Bolsomito” (como Bolsonaro vem sendo conhecido) ainda ostentam que contra o deputado não há denúncia de corrupção. O cara é honesto! Dizem orgulhosos. Resta saber, onde erramos para que a então parte rebelde da sociedade se curve a aberrações como Olavo e Bolsonaro, versões toscas do pensamento reacionário.

Não há uma única resposta. Mas me parece claro que o discurso esquerdista do movimento estudantil soa pedante, chato, repetitivo e distante. Como certa vez escreveu Luiz Felipe Pondé, serve pra comer menininha universitária, mas não para provocar as massas. Mais-valia, imperialismo, neoliberalismo são coisas que não interessam a juventude de hoje, consumista e imediatista. Também os professores marxistas erram feio. Não basta falar que quem vota em Bolsonaro é alienado, “coxinha” e ignorante. Isso é simplismo. São tão arrogantes que não reconhecem que estão fracassando como intelectuais, na pedagogia de construir hegemonia para a esquerda, fomentando a crítica.


As consequências desses fenômenos são graves, pois a extrema-direita avança, o irracionalismo vira sinônimo de eficiência, o debate crítico desaparece. Tudo isso enquanto a mesma direita faz uma denúncia verdadeira: o marxismo domina as universidades. Mas o que eles não sabem é que o marxismo fica do muro pra dentro. Nas escolas e na vida, a “doutrinação marxista” fracassou. 

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

BOMBA: Samuca ignora direção do PV em seu governo e cria racha



O Partido Verde de Volta Redonda emitiu nota onde afirma que sua executiva não foi contemplada na composição do secretariado do prefeito eleito Samuca Silva, do próprio PV. O texto inicia com um “Viva!” ao novo governo, mas passa a imagem de que Samuca nomeou sua equipe sem consultar a direção do partido. Fato confirmado na publicação de Aida Cardoso no seu perfil pessoal na rede social facebook. Aida faz parte da direção executiva do PV. “Exatamente isto! As escolhas não foram influenciadas ou sugeridas pela executiva do Partido...que defende a Política Pública do Partido Verde. Entrou 3 filiados do partido no alto escalão, mas a Executiva NÃO PARTICIPOU de diálogo NENHUM”, escreveu Aida, que segue nos seus comentários: “2018 escolheremos Deputados para defender as pautas TÃO POLÊMICAS que foram debatidas em campanha....eu pelo menos vejo como FUNDAMENTAL a atuação do governo de VR para a escolha de 2018. Agora é aguardar!”. Devemos lembrar que em artigo publicado por este blog em 12 de Outubro já se anunciava a traição do novo prefeito. Quem quiser ler o artigo é só acessar:

http://blogdoadelson.blogspot.com.br/2016/10/afinal-quem-e-samuca-de-verdade.html


sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Organizar a oposição democrática a Samuca

Por Adelson Vidal Alves



O título deste artigo de inicio pode assustar. Afinal, porque pensar em oposição sendo que o prefeito sequer tomou posse ainda? No entanto, a política é um jogo dinâmico, e a dialética oposição x governo não se dá, necessariamente, a partir de ações concretas da governança, ela pode começar já no inicio do jogo, quando os projetos e os campos políticos se estabelecem.

Samuca não pode começar seu governo sem oposição. Ele precisa responder aos milhares de votos contra seu discurso, seu jeito, suas promessas, seus ataques e seu marketing anti-política. Estão do lado dele quem aceitou a desqualificação das instituições, a esculhambação dos partidos, a generalização da política como lugar  da picaretagem e da canalhice, a profecia de um heroísmo solitário quando clamamos pelo pluralismo.

A oposição a Samuca não pode ser sistemática. Deve acompanhar sua gestão com cobrança a suas promessas pra lá de mirabolantes. Em campanha, tranquilizou seus eleitores quanto a saúde financeira do município, e ofereceu gestão, o único elemento que faltaria para superar a crise. A cobrança vem com um projeto real de cidade, feito sob a lucidez de quem tem na política democrática o único caminho para se concretizar avanços cívicos.

De onde virá essa oposição? Dos partidos que se uniram contra o discurso protofascista de Samuca, do parlamento a quem ele desdenhou, dos intelectuais que reconheceram o discurso ilusório que tem tudo pra virar estelionato eleitoral, dos sindicatos e movimentos sociais que ficaram de fora das visitinhas do prefeito enquanto montava sua equipe. Visitou o presidente da CSN e ignorou as organizações populares.


Não se trata de um boicote a seu governo, tampouco criar obstáculos a sua governabilidade. A ingovernabilidade virá naturalmente, por sua arrogância, por sua prepotência, por sua falta de cautela e liderança, pela incapacidade de articulação política. A oposição democrática não derruba ninguém, aceita as regras do jogo, a falta de condições de jogar o jogo da democracia que põe abaixo os governantes. A oposição deve estar pronta para assumir posições quando Samuca e seu governo já não mais conseguirem ficar de pé, seja pelo fracasso de seu falso projeto seja pela traição de suas promessas. 

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Aposta no desconhecido

Por Adelson Vidal Alves



O governo de notáveis não veio. O secretariado de Samuca Silva tem um currículo discreto, com grande parte de nomes desconhecidos. As exceções são Toninho Orestes, duas vezes candidato derrotado a vereador, que irá ocupar a Secretaria de Obras, e Marcia Cury, ex-diretora do Hospital do Retiro e que vai dirigir o Hospital São João Batista. Esta última foi surpresa, haja vista que o prefeito eleito garantiu que ninguém do ex-prefeito Neto ficaria. Marcia, no entanto, é tia do vice-prefeito eleito Maycon Abrantes.

Além disso, há também a não tão estranha desistência da nomeação de Dayse Penna para a poderosa SMAC (Secretaria de Ação Comunitária), que passa para as mãos do novo vice-prefeito. Penna irá ocupar a singela pasta da Secretaria da mulher.

De positivo, a nomeação de uma pessoa do meio para a Secretaria de Esporte e Lazer (SMEL), Maria de Paula Tavares, a Paulinha. A Cultura, pela primeira vez, terá a frente uma pessoa de grande experiência de gestão cultural. Marcia Fernandes dirige, ao lado da irmã, o prestigioso Instituto DAGAZ, com trabalho  comprovado nas periferias. Como assessor especial, Samuca nomeou o competente consultor político Sérgio Boechat.

Fora os citados, um mar de desconhecidos. A aposta de Samuca é evitar nomes desgastados, e manter ao máximo seu discurso eleitoral. Não descarto uma reforma na sua equipe em um prazo breve, na medida em que a inexperiência e a crise bloqueiem resultados rápidos. No momento ele deixa seus opositores em posição de espera.

Todavia, apesar de uma provável lua de mel com seus eleitores nos primeiros meses, Samuca vai criando alguns problemas. Sua equipe de primeiro escalão não contemplou aqueles que estiveram na linha de frente da batalha sangrenta do segundo turno. Os que esperavam ocupar espaço no novo governo ou ficarão sem nada ou terão espaços coadjuvantes. Esse exército pode mudar de lado em pouco tempo. Destaco também que no seu quadro de governo a câmara de vereadores não foi representada. Na prática, isso significa dificuldades para construir uma maioria de governo.

Enfim, são apenas primeiras impressões de um novo tabuleiro político municipal que se inaugura hoje em Volta Redonda. Por enquanto, é isso.


sexta-feira, 25 de novembro de 2016

O fim da religião

Por Adelson Vidal Alves



O filósofo Karl Marx escreveu: "A religião é, na realidade, a consciência e sentimentos próprios do homem que ou ainda não se encontrou ou então já se perdeu. A religião é apenas o sol ilusório em torno do qual se move o homem enquanto não se move em torno de si mesmo". O pensador alemão tratou a religião, ainda, como o “ópio do povo”. Ela seria uma fuga do ser humano de suas responsabilidades, que não se assume como dono dos seus destinos. Antes transfere parte de suas decisões para o sobrenatural, ao invés de enfrentar os problemas com suas próprias forças.

O pensamento religioso é fruto da consciência alienada, que por sua vez vem da divisão social do trabalho e da sociedade de classes. No sistema de produção capitalista o trabalhador se separa de suas ferramentas de trabalho e perde o domínio sobre a totalidade produtiva, desconhecendo o fruto do seu trabalho. Ele é apenas parte. A religião se assenta nessa realidade econômica de modo que ela só irá desaparecer quando os elementos que sustentam a alienação desaparecerem.

Não faz sentido, dessa forma, a militância antirreligiosa de alguns pensadores como Richard Dawkins e Christopher Hitchens, autointitulados “cavalheiros do apocalipse”. Eles usam de palestras, livros e artigos como forma de combate a religião. Desqualificam a religiosidade e acham que usando somente de argumentos racionais  poderão vencer o pensamento religioso. Lutam contra a religiosidade ignorando suas causas.

Não acho que a fé em Deus seja uma “neurose”, como sugeriu Freud. Tampouco ligo a prática religiosa a uma total irracionalidade. A religião, depois que perdeu o monopólico da explicação do mundo natural, passando a dividir essa responsabilidade com a ciência, foi obrigada a se revestir também de algum fundamento da razão, ainda que no fim ela se valha essencialmente da fé e a revelação do sagrado. O religioso não é necessariamente um bitolado.

No entanto, penso que a prática religiosa limita nossa humanização. Prostrados diante do desconhecido, nos submetemos à moral construída em nome de um ser supremo invisível, perdemos a liberdade e a capacidade de agir livremente. O fim da religião seria a consagração da humanidade, a plenitude de nossa espécie como a espécie superior entre os seres vivos, dominantes de tudo, do planeta, da história, da vida, coisas que a religião transferiu para o nome de Deus. Mas o fim da religião só será possível com a construção de uma nova ordem social, onde o homem seja o senhor de si, e não parte de uma hierarquia que divide governantes e governados, trabalhadores e patrões, servos e senhores.



segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Guerras às drogas fracassou

Por Adelson Vidal Alves



Os noticiários trazem diariamente a morte de pessoas por conta do tráfico de drogas. São policiais, traficantes e viciados, que são fatalmente punidos pela disputa sanguinária por territórios entre os grupos criminosos. O tráfico de drogas abastece um poder paralelo que desafia o Estado, cada vez mais cansado diante de uma estratégia fracassada: a guerra às drogas.

Devemos partir do fato de que o consumo de drogas jamais irá acabar, ele vem desde os primórdios da humanidade. Combater o uso é uma estratégia falha, ultrapassada. O melhor a ser feito é a regulamentação por parte do Estado, a legalização gradual dos entorpecentes. As vantagens são óbvias: o trafico perderia força econômica, o Estado teria sob seu controle a distribuição e consumo, o dinheiro arrecadado com os tributos seria usado na saúde e no trabalho de conscientização. Com a droga mais barata, o roubo, o assalto e até a venda de objetos domiciliares que muitos usuários lançam mão para consumir drogas diminuiriam.

Nossos jovens não morrem de overdose, policiais não morrem combatendo usuários. A juventude é assassinada na guerra permanente entre a Polícia e o poder do crime organizado, policiais são abatidos por criminosos que se valem de um poder que vem da venda ilegal das drogas. Podemos botar um fim nisso, fazendo da droga um problema de saúde pública, não mais de policia, como funciona com o álcool e o cigarro.

Temos exemplos na história que nos apontam o melhor caminho. A Colômbia optou por uma guerra irracional contra as drogas, gastou milhões com ajuda dos EUA. Foram mínimos os resultados positivos. Países como o Peru, por exemplo, conseguiram resultado melhores dando direções mais racionais às suas políticas em relação ao consumo de drogas. No Uruguai, depois da legalização da maconha, o número de mortes por tráfico é praticamente zero.

É preciso reorientar as ações do Estado para que a política de segurança pública seja aliviada da tarefa de enfrentar um sistema criminoso de tráfico de drogas tão perigoso. Legalizar e controlar é a solução.

                                        

sexta-feira, 18 de novembro de 2016

A prisão de Garotinho sacia a sede dos “justiceiros" da barbárie

Por Adelson Vidal Alves



O ex-governador Anthony Garotinho é acusado de usar de programa social na compra de votos quando governava o estado do Rio de Janeiro. Foi preso pela Polícia Federal, não foi condenado, e pelo que sei, não tinha força para atrapalhar as investigações. Bem, deixemos isso para os juristas. O que me preocupa é o espetáculo midiático e popular criado em torno da detenção de Garotinho.

O filósofo Michel Foucault em seu clássico “vigiar e punir” narra a evolução do sistema penal mundial. Em outros tempos, valia a penúria, o sofrimento, a dor do condenado. Era a punição do crime com os maiores horrores possíveis, sempre em praça pública. Era a vingança, não a justiça.

Hoje, evoluímos para um paradigma cívico no qual a interpretação de um crime leva em consideração uma série de fatores, atenuantes ou agravantes. A punição não visa apenas castigar como exemplo, mas também reeducar para a volta do convívio social. Um preso recuperado não é bom só pra ele, é bom pra sociedade. Um perigo a menos. Apesar disso, segue o sentimento “justiceiro”, as vezes a tal “justiça” é feita com as próprias mãos. Não a toa, aumentam os casos de linchamento de supostos assassinos, estupradores ou agressores de criança. Os condenados estão exclusivamente sob o júri da paixão de uma sociedade sedenta de sangue e violência. Não são raro os casos onde a vítima mais tarde se comprova inocente.

Garotinho, antes da sentença judicial, foi arrastado em uma maca . Comprovadamente doente, foi jogado em uma ambulância aos gritos da filha desesperada. O vídeo, comemorado nas redes sociais, era a própria cena da barbárie. Os que aplaudiram a violação da dignidade humana do ex-governador mal sabem o crime que ele cometeu, mas isso não faz diferença, né? Ele é político, e todo o político não presta. Não merece julgamento, defesa, e nem respeito a seus direitos constitucionais como gente. Bom é o juiz que nega todos seus direitos, o agente público que age com truculência ilegal contra familiares que se desesperam pela dor de um parente, culpado ou não.

O caso de Garotinho está longe de significar alguma evolução civilizatória, passa distante de algum motivo para comemorarmos justiça. Nos aproxima da barbárie, do abuso de poder, do judiciário autoritário e da sede popular pela barbárie. Nos afasta da democracia e da cultura cívica.


sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Porque os neopentecostais falam aos pobres melhor que a esquerda?

Por Adelson Vidal Alves



Segundo números recentes do IBGE, os protestantes vem tendo crescimento significativo no Brasil. Mas não são as igrejas históricas, como a Batista, a presbiteriana, luterana ou metodista. Tratam-se de novas formas de ser igreja, centrada num culto mais espetaculoso, barulhento, com ênfase na emoção, na sensibilidade das pessoas. A teologia é pobre. Uma espécie de manipulação dos textos bíblicos para atender doutrinas bizarras e perigosas. Promete-se a cura de uma unha encravada até o casamento reatado. Em troca, a obediência cega ao líder, a dedicação rigorosa aos compromissos financeiros com a igreja, que recebe atenção especial nas reuniões. O pagamento de dízimos e ofertas são precedidos de longas leituras bíblicas, testemunhos sensacionalistas, tudo para convencer o fiel que sua contribuição econômica pode melhorar sua vida, te dar aquele carrão, aquela casa ou te arrumar um belo emprego. Por fim, a presença constante do demônio como personalização do mal nos seus discursos.

Os neopentecostais avançam cada vez mais. Não apenas no campo religioso, ao perceberem seu tamanho e sua influência, resolveram transformar sua força de fé em poder. A mais poderosa igreja neopentecostal - a Igreja Universal-  tem partido político e televisão. PRB e Record. Dominam hoje as bancadas religiosas, e o voto de seus fieis quase sempre acompanham o apoio das lideranças. Falamos aqui de uma força coesa, homogênea, obediente e orquestrada, por isso é perigosa.

O interessante nisso tudo, do ponto de vista da política, é seu avanço nos setores mais pobres, onde a esquerda, por coerência histórica, deveria ter mais força. Ao contrário, o neopentacostalismo, de direita, reacionário e até homofóbico, domina os grotões de miséria, como testemunhou o recente segundo turno do Rio de Janeiro. Mas porque isso acontece?

Os motivos são vários, mas é fato que a esquerda brasileira não consegue entender a cultura própria desse setor social. Oferecem um futuro longínquo de igualdade, através da luta, da organização, enquanto o que eles querem é a prosperidade burguesa, a quem a esquerda trata como inimiga de classe.  A linguagem com que se direciona tal proposta vem cheia de “ismos”, “socialismo”, “neoliberalismo”, “imperialismo” e por ai vai. Termos distantes da vida de quem mal teve condições de frequentar uma escola pública. Os neopentecostais prometem resoluções rápidas, milagrosas, com uma conversa serena em redes de proteção emocional, com a comunidade religiosa abraçando, dando carinho e atenção aos desprotegidos. Os empobrecidos não são privados apenas de ação direta do Estado, mas de atenção, eles querem ser ouvidos.

Outra coisa é a presença no cotidiano. A esquerda abandonou o trabalho de base, não tem mais partidos ou núcleos de trabalho popular. A igreja está diariamente nos pontos mais marginalizados da cidade, com aconselhamentos, cuidados assistenciais e culturais. A quem essa população vai ouvir? Militantes universitários e intelectuais da zona sul ou pastores que falam diretamente a língua deles?

O desafio da esquerda consiste em entender melhor os pobres, e se propor a viver com eles, organizando e politizando com eles. Por enquanto ela age com vanguardismo, achando que sua ida a favela é uma missão civilizatória. Eis a razão de seu fracasso.


domingo, 6 de novembro de 2016

Ou governa ou cai

Por Adelson Vidal Alves



Em 1 de Janeiro de 2017 Volta Redonda dará posse a seu novo prefeito, o jovem Samuca Silva. Eufóricos e atônitos serão sua plateia. Os primeiros com uma crença convicta na pureza moral do novo gestor, os segundos incrédulos com o inexplicável voo no escuro. O fato, porém, é que ele é um prefeito legítimo, eleito pela vontade popular.

Mas a política é uma arte que nos permite fazer prognósticos. Não é ciência exata, mas se move por experiências históricas a serem aprendidas. Uma delas é que a democracia é um sistema político de labirintos generosos e desafiadores, ou a defira ou ela te devora. Samuca vai ter que aprender isso.

O inicio, sem ter sido de fato um inicio, mostra graves dilemas de bastidores. Nenhum governante triunfou de costas para o parlamento, e os primeiros sinais do novo Executivo que virá é muito mais para um confronto de poderes de Estado do que uma reconciliação municipal. Os vereadores, eleitos e derrotados, não olham com bons olhos o tom bonapartista e populista de Samuca. Um gesto nobre do mandatário maior eleito seria o de um convite público a governabilidade, entendendo que isso passa pela composição de um governo de coalizão. Claro, não falo de negociatas espúrias, mas de política mesmo.

Ou governa ou cai: é o recado da história aos governantes que ousam enfrentar as instituições. Estão ai os casos de Collor e Dilma. Além do perfil autoritário dos dois, falaram contra eles a crise econômica e o crime de responsabilidade. O primeiro elemento já está presente, o segundo é sempre uma possibilidade. Imaginem um inexperiente governante sem apoio parlamentar, em plena crise fiscal?  Um crime contra o orçamento seria algo a rondar as planilhas de governo. Caso caia em uma armadilha ao molde “jeitinho brasileiro”, o fato jurídico para um impeachment estaria colocado. Sem base no parlamento, sofreria impedimento.


Sem afobações, esperaremos com o “otimismo da vontade” que tudo dê certo, contudo, a conclusão do mandato de prefeito não depende apenas das urnas, depende do caminho governamental a ser escolhido. Saber se relacionar com os órgãos democráticos é uma exigência, se Samuca não cumprir bem este papel, cai antes de terminar seu 4 anos. 

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

A REDE precisa de um programa claro de sociedade

Por Adelson Vidal Alves


A REDE SUSTENTABILIDADE, partido que sou filiado e porta voz em Volta Redonda, é um esforço honesto e legítimo de brasileiros convictos que a velha política de fisiologismo, clientelismo e patrimonialismo  deve ser superada. A política de balcão de negócios nos coloca historicamente numa ciranda de vícios que nos impedem de superar, como nação, nossos problemas mais graves: o racismo, o machismo, a misoginia, as desigualdades, a violência e a extrema pobreza.

A política, em sua forma democrática, é o único caminho seguro para operarmos transformações sociais que vença esse atraso, através de pactos, construções de consensos, sempre renováveis. Neste desafio os partidos políticos são peças fundamentais, pois são eles os representantes de projetos universais, de Estado e sociedade. Mas a crise partidária também é uma realidade, pois os partidos não foram capazes de se modernizar, não respondem ao anseio popular, e quase sempre se apresentam como abrigos temporários de poder a velhos caciques. É preciso mudar, e a REDE é uma dessas tentativas de mudança. Mas está conseguindo obter sucesso?

A REDE cresceu em torno da figura de Marina Silva, com foco na nova política e na sustentabilidade. Tem a ambição de se organizar horizontalmente, diferente da verticalidade dos partidos tradicionais. Tem nas redes sociais uma esperança para irmos além da democracia institucional, favorecendo a participação popular mais ampla. Mira os exemplos de partidos como o PODEMOS na Espanha, que surgiram após as grandes manifestações globais contra a atual ordem de coisas. É plural, pois aceita em suas fileiras vários grupos ideológicos, que minimamente comungam com as diretrizes de seu manifesto. Aqui mora sua grande virtude e fragilidade.

Virtude pois rejeita um modelo partidário de cunho finalístico, mas sua pluralidade mal equacionada, vem sendo responsável pela falta de rosto do partido, criando bases que vão desde o eurocomunismo até religiosos conservadores. Na verdade, não temos uma base real de sustentação, temos agrupamentos agindo no interior do partido com intenções particulares, sem um eixo central, porque o partido ainda não construiu seu eixo.

A falta de convergência foi clara na votação de impeachment. Enquanto a direção nacional apontou voto a favor do impedimento, 3 dos nossos 5 parlamentares votaram contra a orientação nacional, com defesas exacerbadas de Dilma e o PT. Um de nossos parlamentares acusou o impeachment de golpe, e indiretamente atingiu a maioria da militância e também Marina Silva.

Também foi notada a construção de alianças sem critérios. Em alguns municípios os acordos giraram em torno de projetos de centro-direita, como em Porto Alegre, em outros, caminhamos com a extrema-esquerda, como no Rio de Janeiro. Quem é a REDE afinal?


A falta de coesão e projeto claro de sociedade foi responsável pela perda de quadros intelectuais importantes do partido, como o antropólogo Luiz Eduardo Soares. A REDE precisa ser mais que uma reunião de pessoas de boa intenção, é preciso ter um programa claro, capaz de reunir uma base sólida em torno desse projeto. É preciso declarar à sociedade que temos algo de novo a dizer, uma saída real e concreta para a crise civilizatória de nossos tempos. A razão da REDE existir passa por este desafio, do contrário, não tem porque existir. 

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Mais uma chance para a social-democracia

Por Adelson Vidal Alves


A década de 1990 foi emblemática no sentido que interrompeu a experiência histórica do chamado “socialismo realmente existente”, junto com a ela veio uma espécie de demonização do Estado, como sendo um aparelho pesado, obstáculo para o desenvolvimento econômico aos moldes da liberdade de mercado. Nesse sentido, triunfou o neoliberalismo, a receita do Consenso de Washington, desregulamentação, redução do papel do Estado e até flexibilização em direitos trabalhistas. Primeiro no Chile, depois na Inglaterra, o neoliberalismo fez da América Latina o seu continente. O Brasil de Collor e FHC, ainda que em moldes mais “lights” que os de Thatcher e Reagan, também se seduziu pela mão invisível do mercado.

O esgotamento do neoliberalismo no Brasil trouxe ao poder a variante social-democrata brasileira ligada ao sindicalismo. O PT de Lula chegou ao poder proclamando a construção de um desenvolvimento nacional tendo o Estado como indutor, a construção de uma rede de proteção social, a distribuição de renda e geração de emprego. A outra social-democracia se organizou na oposição, e fez um duelo desde então com seu irmão social-democrata na luta pelo poder central. Recentemente o nacional-desenvolvimentismo dos governos petistas perdeu força, e o grande erro do governo petista foi insistir em se manter fiel, na economia, a uma cópia rigorosa dos anos 50. Sem a capacidade de modernização na gestão, o Brasil ficou frágil em seu modelo econômico, vulnerável a crise, que atingiu em cheio o PT, em que o já citado modelo econômico ao lado da crise ética foram os principais motivos que interromperam o ciclo do partido no poder e seu brutal enxugamento nestas eleições de 2016, perdendo quase todas as prefeituras de grande porte que disputou.

A vitória eleitoral deste ano destacou o crescimento de dois partidos de perfil social-democrata: o PSDB e o PPS. O primeiro, aliado do atual governo federal, precisa de uma refundação. Nos últimos anos se inclinou para a direita, absorveu em suas administrações o liberalismo econômico. Caso se reafirme ideologicamente, pode liderar um bloco que seja porta voz desta social-democracia nos nossos tempos, com um projeto reformista, capaz de sustentar um Estado no tamanho ideal para promover o desenvolvimento, diminuir as desigualdades, e democratizar a sociedade brasileira em todas as esferas; econômica, social e cultural.

O PPS – herdeiro democrático do partidão- já em 1991 abandonou perspectivas revolucionárias e se adequou ao reformismo democrático. Mas como bem observou o sociólogo José de Souza Martins, é hoje o mais autêntico social-democrata entre todos os partidos. Também se espera dele uma clareza maior nesta questão, para que decisivamente se credencie como força neste campo da esquerda democrática.


Enfim, as urnas rejeitaram a esquerda histórica, radical e presa a dogmas revolucionaristas, ainda que esta tenha conseguido um crescimento aqui ou lá, mas permanecem pequenos. Nossa tradição histórica social-democrata, cravada na carta de 1988, volta a ganhar força, inclusive para reorientar o governo Temer contra os excessos de ajustes que desconstroem conquistas sociais consagradas na carta cidadã. A social-democracia mais uma vez se mostra o caminho mais desejado pelo povo brasileiro. 

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

O voo no escuro

Por Adelson Vidal Alves



Nas comemorações da vitória de Samuca um caixão com os nomes de Baltazar, Nelson Gonçalves, Zoinho e América Tereza era exibido com orgulho. Os apoiadores do prefeito eleito diziam celebrar o fim da velha política, não nos termos da democracia, em que o adversário é tido como opositor legítimo, e dentro do comportamento cívico, é reconhecido como possível interlocutor no futuro, mas no linguajar fascista, onde o outro não é só derrotado, também é massacrado, eliminado. O clube Náutico parecia estar celebrando o título de um time de futebol, esporte onde a razão cede gentilmente à paixão. Na política não deveria ser assim, mas quando ela funciona sob o mito, o heroísmo, o sebastianismo e o messianismo, geralmente é isso que acontece.

Passando a ressaca, a vida real. Samuca pegará uma prefeitura endividada, cerca de 5oo milhões de rombo, metade do orçamento previsto para o próximo ano. Herdará uma máquina inchada, enfrentará uma crise econômica que atinge o Brasil e o estado do Rio de Janeiro. Para cumprir o que prometeu, terá que recorrer a uma política de austeridade fiscal, reduzir gastos, aplicar reformas administrativas. Diante destes desafios, necessitará não apenas da teoria de gestão que ele diz ter, vai precisar do parlamento, onde 18 dos 21 vereadores apoiaram seu adversário.

O que ele pretende fazer? Pode abandonar tudo que disse no segundo turno, ceder as regras da governabilidade e compor um governo de coalizão. De cara, vai decepcionar grande parte dos seus eleitores, que acreditaram quando ele prometeu “governar só com o cidadão”, algo impossível numa democracia representativa. Se se aventurar a enfrentar a câmara, a sociedade organizada e as instituições de mediação democrática, estará arriscando a não terminar seu mandato. Grave dilema.

Outro desafio é a composição de seu secretariado. O PV não tem quadros para administrar uma cidade, e a escolha dos principais nomes pode ser dentro de uma perspectiva tecnocrata ou de uma sinalização para a política e os partidos. O clima do segundo turno dividiu a cidade, cabe a Samuca não repetir o gesto hostil de seus seguidores, e reconciliar o município para uma governança focada na população. Insistir na polarização, no “eles contra nós” será uma irresponsabilidade e também um erro.

Enfim, para usar de uma metáfora tão utilizada por Baltazar, Samuca é um voo no escuro. Os próximos atos seus começarão a nos dar elementos para análises políticas mais concretas de seu novo governo, até agora o que temos é a euforia, o oba-oba e as promessas infundadas de um governo solitário. Agora é aguardar se o voo no escuro nos levará para um porto seguro ou para um fim mais trágico. Aguardemos.