Por Adelson Vidal Alves
Nas comemorações da vitória de
Samuca um caixão com os nomes de Baltazar, Nelson Gonçalves, Zoinho e América
Tereza era exibido com orgulho. Os apoiadores do prefeito eleito diziam
celebrar o fim da velha política, não nos termos da democracia, em que o
adversário é tido como opositor legítimo, e dentro do comportamento cívico, é
reconhecido como possível interlocutor no futuro, mas no linguajar fascista,
onde o outro não é só derrotado, também é massacrado, eliminado. O clube Náutico
parecia estar celebrando o título de um time de futebol, esporte onde a razão
cede gentilmente à paixão. Na política não deveria ser assim, mas quando ela
funciona sob o mito, o heroísmo, o sebastianismo e o messianismo, geralmente é
isso que acontece.
Passando a ressaca, a vida
real. Samuca pegará uma prefeitura endividada, cerca de 5oo milhões de rombo,
metade do orçamento previsto para o próximo ano. Herdará uma máquina inchada, enfrentará
uma crise econômica que atinge o Brasil e o estado do Rio de Janeiro. Para
cumprir o que prometeu, terá que recorrer a uma política de austeridade fiscal,
reduzir gastos, aplicar reformas administrativas. Diante destes desafios,
necessitará não apenas da teoria de gestão que ele diz ter, vai precisar do
parlamento, onde 18 dos 21 vereadores apoiaram seu adversário.
O que ele pretende fazer? Pode
abandonar tudo que disse no segundo turno, ceder as regras da governabilidade e
compor um governo de coalizão. De cara, vai decepcionar grande parte dos seus
eleitores, que acreditaram quando ele prometeu “governar só com o cidadão”,
algo impossível numa democracia representativa. Se se aventurar a enfrentar a
câmara, a sociedade organizada e as instituições de mediação democrática, estará
arriscando a não terminar seu mandato. Grave dilema.
Outro desafio é a composição de
seu secretariado. O PV não tem quadros para administrar uma cidade, e a escolha
dos principais nomes pode ser dentro de uma perspectiva tecnocrata ou de uma
sinalização para a política e os partidos. O clima do segundo turno dividiu a
cidade, cabe a Samuca não repetir o gesto hostil de seus seguidores, e
reconciliar o município para uma governança focada na população. Insistir na
polarização, no “eles contra nós” será uma irresponsabilidade e também um erro.
Enfim, para usar de uma
metáfora tão utilizada por Baltazar, Samuca é um voo no escuro. Os próximos
atos seus começarão a nos dar elementos para análises políticas mais concretas
de seu novo governo, até agora o que temos é a euforia, o oba-oba e as
promessas infundadas de um governo solitário. Agora é aguardar se o voo no
escuro nos levará para um porto seguro ou para um fim mais trágico. Aguardemos.