quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Aposta no desconhecido

Por Adelson Vidal Alves



O governo de notáveis não veio. O secretariado de Samuca Silva tem um currículo discreto, com grande parte de nomes desconhecidos. As exceções são Toninho Orestes, duas vezes candidato derrotado a vereador, que irá ocupar a Secretaria de Obras, e Marcia Cury, ex-diretora do Hospital do Retiro e que vai dirigir o Hospital São João Batista. Esta última foi surpresa, haja vista que o prefeito eleito garantiu que ninguém do ex-prefeito Neto ficaria. Marcia, no entanto, é tia do vice-prefeito eleito Maycon Abrantes.

Além disso, há também a não tão estranha desistência da nomeação de Dayse Penna para a poderosa SMAC (Secretaria de Ação Comunitária), que passa para as mãos do novo vice-prefeito. Penna irá ocupar a singela pasta da Secretaria da mulher.

De positivo, a nomeação de uma pessoa do meio para a Secretaria de Esporte e Lazer (SMEL), Maria de Paula Tavares, a Paulinha. A Cultura, pela primeira vez, terá a frente uma pessoa de grande experiência de gestão cultural. Marcia Fernandes dirige, ao lado da irmã, o prestigioso Instituto DAGAZ, com trabalho  comprovado nas periferias. Como assessor especial, Samuca nomeou o competente consultor político Sérgio Boechat.

Fora os citados, um mar de desconhecidos. A aposta de Samuca é evitar nomes desgastados, e manter ao máximo seu discurso eleitoral. Não descarto uma reforma na sua equipe em um prazo breve, na medida em que a inexperiência e a crise bloqueiem resultados rápidos. No momento ele deixa seus opositores em posição de espera.

Todavia, apesar de uma provável lua de mel com seus eleitores nos primeiros meses, Samuca vai criando alguns problemas. Sua equipe de primeiro escalão não contemplou aqueles que estiveram na linha de frente da batalha sangrenta do segundo turno. Os que esperavam ocupar espaço no novo governo ou ficarão sem nada ou terão espaços coadjuvantes. Esse exército pode mudar de lado em pouco tempo. Destaco também que no seu quadro de governo a câmara de vereadores não foi representada. Na prática, isso significa dificuldades para construir uma maioria de governo.

Enfim, são apenas primeiras impressões de um novo tabuleiro político municipal que se inaugura hoje em Volta Redonda. Por enquanto, é isso.


sexta-feira, 25 de novembro de 2016

O fim da religião

Por Adelson Vidal Alves



O filósofo Karl Marx escreveu: "A religião é, na realidade, a consciência e sentimentos próprios do homem que ou ainda não se encontrou ou então já se perdeu. A religião é apenas o sol ilusório em torno do qual se move o homem enquanto não se move em torno de si mesmo". O pensador alemão tratou a religião, ainda, como o “ópio do povo”. Ela seria uma fuga do ser humano de suas responsabilidades, que não se assume como dono dos seus destinos. Antes transfere parte de suas decisões para o sobrenatural, ao invés de enfrentar os problemas com suas próprias forças.

O pensamento religioso é fruto da consciência alienada, que por sua vez vem da divisão social do trabalho e da sociedade de classes. No sistema de produção capitalista o trabalhador se separa de suas ferramentas de trabalho e perde o domínio sobre a totalidade produtiva, desconhecendo o fruto do seu trabalho. Ele é apenas parte. A religião se assenta nessa realidade econômica de modo que ela só irá desaparecer quando os elementos que sustentam a alienação desaparecerem.

Não faz sentido, dessa forma, a militância antirreligiosa de alguns pensadores como Richard Dawkins e Christopher Hitchens, autointitulados “cavalheiros do apocalipse”. Eles usam de palestras, livros e artigos como forma de combate a religião. Desqualificam a religiosidade e acham que usando somente de argumentos racionais  poderão vencer o pensamento religioso. Lutam contra a religiosidade ignorando suas causas.

Não acho que a fé em Deus seja uma “neurose”, como sugeriu Freud. Tampouco ligo a prática religiosa a uma total irracionalidade. A religião, depois que perdeu o monopólico da explicação do mundo natural, passando a dividir essa responsabilidade com a ciência, foi obrigada a se revestir também de algum fundamento da razão, ainda que no fim ela se valha essencialmente da fé e a revelação do sagrado. O religioso não é necessariamente um bitolado.

No entanto, penso que a prática religiosa limita nossa humanização. Prostrados diante do desconhecido, nos submetemos à moral construída em nome de um ser supremo invisível, perdemos a liberdade e a capacidade de agir livremente. O fim da religião seria a consagração da humanidade, a plenitude de nossa espécie como a espécie superior entre os seres vivos, dominantes de tudo, do planeta, da história, da vida, coisas que a religião transferiu para o nome de Deus. Mas o fim da religião só será possível com a construção de uma nova ordem social, onde o homem seja o senhor de si, e não parte de uma hierarquia que divide governantes e governados, trabalhadores e patrões, servos e senhores.



segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Guerras às drogas fracassou

Por Adelson Vidal Alves



Os noticiários trazem diariamente a morte de pessoas por conta do tráfico de drogas. São policiais, traficantes e viciados, que são fatalmente punidos pela disputa sanguinária por territórios entre os grupos criminosos. O tráfico de drogas abastece um poder paralelo que desafia o Estado, cada vez mais cansado diante de uma estratégia fracassada: a guerra às drogas.

Devemos partir do fato de que o consumo de drogas jamais irá acabar, ele vem desde os primórdios da humanidade. Combater o uso é uma estratégia falha, ultrapassada. O melhor a ser feito é a regulamentação por parte do Estado, a legalização gradual dos entorpecentes. As vantagens são óbvias: o trafico perderia força econômica, o Estado teria sob seu controle a distribuição e consumo, o dinheiro arrecadado com os tributos seria usado na saúde e no trabalho de conscientização. Com a droga mais barata, o roubo, o assalto e até a venda de objetos domiciliares que muitos usuários lançam mão para consumir drogas diminuiriam.

Nossos jovens não morrem de overdose, policiais não morrem combatendo usuários. A juventude é assassinada na guerra permanente entre a Polícia e o poder do crime organizado, policiais são abatidos por criminosos que se valem de um poder que vem da venda ilegal das drogas. Podemos botar um fim nisso, fazendo da droga um problema de saúde pública, não mais de policia, como funciona com o álcool e o cigarro.

Temos exemplos na história que nos apontam o melhor caminho. A Colômbia optou por uma guerra irracional contra as drogas, gastou milhões com ajuda dos EUA. Foram mínimos os resultados positivos. Países como o Peru, por exemplo, conseguiram resultado melhores dando direções mais racionais às suas políticas em relação ao consumo de drogas. No Uruguai, depois da legalização da maconha, o número de mortes por tráfico é praticamente zero.

É preciso reorientar as ações do Estado para que a política de segurança pública seja aliviada da tarefa de enfrentar um sistema criminoso de tráfico de drogas tão perigoso. Legalizar e controlar é a solução.

                                        

sexta-feira, 18 de novembro de 2016

A prisão de Garotinho sacia a sede dos “justiceiros" da barbárie

Por Adelson Vidal Alves



O ex-governador Anthony Garotinho é acusado de usar de programa social na compra de votos quando governava o estado do Rio de Janeiro. Foi preso pela Polícia Federal, não foi condenado, e pelo que sei, não tinha força para atrapalhar as investigações. Bem, deixemos isso para os juristas. O que me preocupa é o espetáculo midiático e popular criado em torno da detenção de Garotinho.

O filósofo Michel Foucault em seu clássico “vigiar e punir” narra a evolução do sistema penal mundial. Em outros tempos, valia a penúria, o sofrimento, a dor do condenado. Era a punição do crime com os maiores horrores possíveis, sempre em praça pública. Era a vingança, não a justiça.

Hoje, evoluímos para um paradigma cívico no qual a interpretação de um crime leva em consideração uma série de fatores, atenuantes ou agravantes. A punição não visa apenas castigar como exemplo, mas também reeducar para a volta do convívio social. Um preso recuperado não é bom só pra ele, é bom pra sociedade. Um perigo a menos. Apesar disso, segue o sentimento “justiceiro”, as vezes a tal “justiça” é feita com as próprias mãos. Não a toa, aumentam os casos de linchamento de supostos assassinos, estupradores ou agressores de criança. Os condenados estão exclusivamente sob o júri da paixão de uma sociedade sedenta de sangue e violência. Não são raro os casos onde a vítima mais tarde se comprova inocente.

Garotinho, antes da sentença judicial, foi arrastado em uma maca . Comprovadamente doente, foi jogado em uma ambulância aos gritos da filha desesperada. O vídeo, comemorado nas redes sociais, era a própria cena da barbárie. Os que aplaudiram a violação da dignidade humana do ex-governador mal sabem o crime que ele cometeu, mas isso não faz diferença, né? Ele é político, e todo o político não presta. Não merece julgamento, defesa, e nem respeito a seus direitos constitucionais como gente. Bom é o juiz que nega todos seus direitos, o agente público que age com truculência ilegal contra familiares que se desesperam pela dor de um parente, culpado ou não.

O caso de Garotinho está longe de significar alguma evolução civilizatória, passa distante de algum motivo para comemorarmos justiça. Nos aproxima da barbárie, do abuso de poder, do judiciário autoritário e da sede popular pela barbárie. Nos afasta da democracia e da cultura cívica.


sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Porque os neopentecostais falam aos pobres melhor que a esquerda?

Por Adelson Vidal Alves



Segundo números recentes do IBGE, os protestantes vem tendo crescimento significativo no Brasil. Mas não são as igrejas históricas, como a Batista, a presbiteriana, luterana ou metodista. Tratam-se de novas formas de ser igreja, centrada num culto mais espetaculoso, barulhento, com ênfase na emoção, na sensibilidade das pessoas. A teologia é pobre. Uma espécie de manipulação dos textos bíblicos para atender doutrinas bizarras e perigosas. Promete-se a cura de uma unha encravada até o casamento reatado. Em troca, a obediência cega ao líder, a dedicação rigorosa aos compromissos financeiros com a igreja, que recebe atenção especial nas reuniões. O pagamento de dízimos e ofertas são precedidos de longas leituras bíblicas, testemunhos sensacionalistas, tudo para convencer o fiel que sua contribuição econômica pode melhorar sua vida, te dar aquele carrão, aquela casa ou te arrumar um belo emprego. Por fim, a presença constante do demônio como personalização do mal nos seus discursos.

Os neopentecostais avançam cada vez mais. Não apenas no campo religioso, ao perceberem seu tamanho e sua influência, resolveram transformar sua força de fé em poder. A mais poderosa igreja neopentecostal - a Igreja Universal-  tem partido político e televisão. PRB e Record. Dominam hoje as bancadas religiosas, e o voto de seus fieis quase sempre acompanham o apoio das lideranças. Falamos aqui de uma força coesa, homogênea, obediente e orquestrada, por isso é perigosa.

O interessante nisso tudo, do ponto de vista da política, é seu avanço nos setores mais pobres, onde a esquerda, por coerência histórica, deveria ter mais força. Ao contrário, o neopentacostalismo, de direita, reacionário e até homofóbico, domina os grotões de miséria, como testemunhou o recente segundo turno do Rio de Janeiro. Mas porque isso acontece?

Os motivos são vários, mas é fato que a esquerda brasileira não consegue entender a cultura própria desse setor social. Oferecem um futuro longínquo de igualdade, através da luta, da organização, enquanto o que eles querem é a prosperidade burguesa, a quem a esquerda trata como inimiga de classe.  A linguagem com que se direciona tal proposta vem cheia de “ismos”, “socialismo”, “neoliberalismo”, “imperialismo” e por ai vai. Termos distantes da vida de quem mal teve condições de frequentar uma escola pública. Os neopentecostais prometem resoluções rápidas, milagrosas, com uma conversa serena em redes de proteção emocional, com a comunidade religiosa abraçando, dando carinho e atenção aos desprotegidos. Os empobrecidos não são privados apenas de ação direta do Estado, mas de atenção, eles querem ser ouvidos.

Outra coisa é a presença no cotidiano. A esquerda abandonou o trabalho de base, não tem mais partidos ou núcleos de trabalho popular. A igreja está diariamente nos pontos mais marginalizados da cidade, com aconselhamentos, cuidados assistenciais e culturais. A quem essa população vai ouvir? Militantes universitários e intelectuais da zona sul ou pastores que falam diretamente a língua deles?

O desafio da esquerda consiste em entender melhor os pobres, e se propor a viver com eles, organizando e politizando com eles. Por enquanto ela age com vanguardismo, achando que sua ida a favela é uma missão civilizatória. Eis a razão de seu fracasso.


domingo, 6 de novembro de 2016

Ou governa ou cai

Por Adelson Vidal Alves



Em 1 de Janeiro de 2017 Volta Redonda dará posse a seu novo prefeito, o jovem Samuca Silva. Eufóricos e atônitos serão sua plateia. Os primeiros com uma crença convicta na pureza moral do novo gestor, os segundos incrédulos com o inexplicável voo no escuro. O fato, porém, é que ele é um prefeito legítimo, eleito pela vontade popular.

Mas a política é uma arte que nos permite fazer prognósticos. Não é ciência exata, mas se move por experiências históricas a serem aprendidas. Uma delas é que a democracia é um sistema político de labirintos generosos e desafiadores, ou a defira ou ela te devora. Samuca vai ter que aprender isso.

O inicio, sem ter sido de fato um inicio, mostra graves dilemas de bastidores. Nenhum governante triunfou de costas para o parlamento, e os primeiros sinais do novo Executivo que virá é muito mais para um confronto de poderes de Estado do que uma reconciliação municipal. Os vereadores, eleitos e derrotados, não olham com bons olhos o tom bonapartista e populista de Samuca. Um gesto nobre do mandatário maior eleito seria o de um convite público a governabilidade, entendendo que isso passa pela composição de um governo de coalizão. Claro, não falo de negociatas espúrias, mas de política mesmo.

Ou governa ou cai: é o recado da história aos governantes que ousam enfrentar as instituições. Estão ai os casos de Collor e Dilma. Além do perfil autoritário dos dois, falaram contra eles a crise econômica e o crime de responsabilidade. O primeiro elemento já está presente, o segundo é sempre uma possibilidade. Imaginem um inexperiente governante sem apoio parlamentar, em plena crise fiscal?  Um crime contra o orçamento seria algo a rondar as planilhas de governo. Caso caia em uma armadilha ao molde “jeitinho brasileiro”, o fato jurídico para um impeachment estaria colocado. Sem base no parlamento, sofreria impedimento.


Sem afobações, esperaremos com o “otimismo da vontade” que tudo dê certo, contudo, a conclusão do mandato de prefeito não depende apenas das urnas, depende do caminho governamental a ser escolhido. Saber se relacionar com os órgãos democráticos é uma exigência, se Samuca não cumprir bem este papel, cai antes de terminar seu 4 anos. 

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

A REDE precisa de um programa claro de sociedade

Por Adelson Vidal Alves


A REDE SUSTENTABILIDADE, partido que sou filiado e porta voz em Volta Redonda, é um esforço honesto e legítimo de brasileiros convictos que a velha política de fisiologismo, clientelismo e patrimonialismo  deve ser superada. A política de balcão de negócios nos coloca historicamente numa ciranda de vícios que nos impedem de superar, como nação, nossos problemas mais graves: o racismo, o machismo, a misoginia, as desigualdades, a violência e a extrema pobreza.

A política, em sua forma democrática, é o único caminho seguro para operarmos transformações sociais que vença esse atraso, através de pactos, construções de consensos, sempre renováveis. Neste desafio os partidos políticos são peças fundamentais, pois são eles os representantes de projetos universais, de Estado e sociedade. Mas a crise partidária também é uma realidade, pois os partidos não foram capazes de se modernizar, não respondem ao anseio popular, e quase sempre se apresentam como abrigos temporários de poder a velhos caciques. É preciso mudar, e a REDE é uma dessas tentativas de mudança. Mas está conseguindo obter sucesso?

A REDE cresceu em torno da figura de Marina Silva, com foco na nova política e na sustentabilidade. Tem a ambição de se organizar horizontalmente, diferente da verticalidade dos partidos tradicionais. Tem nas redes sociais uma esperança para irmos além da democracia institucional, favorecendo a participação popular mais ampla. Mira os exemplos de partidos como o PODEMOS na Espanha, que surgiram após as grandes manifestações globais contra a atual ordem de coisas. É plural, pois aceita em suas fileiras vários grupos ideológicos, que minimamente comungam com as diretrizes de seu manifesto. Aqui mora sua grande virtude e fragilidade.

Virtude pois rejeita um modelo partidário de cunho finalístico, mas sua pluralidade mal equacionada, vem sendo responsável pela falta de rosto do partido, criando bases que vão desde o eurocomunismo até religiosos conservadores. Na verdade, não temos uma base real de sustentação, temos agrupamentos agindo no interior do partido com intenções particulares, sem um eixo central, porque o partido ainda não construiu seu eixo.

A falta de convergência foi clara na votação de impeachment. Enquanto a direção nacional apontou voto a favor do impedimento, 3 dos nossos 5 parlamentares votaram contra a orientação nacional, com defesas exacerbadas de Dilma e o PT. Um de nossos parlamentares acusou o impeachment de golpe, e indiretamente atingiu a maioria da militância e também Marina Silva.

Também foi notada a construção de alianças sem critérios. Em alguns municípios os acordos giraram em torno de projetos de centro-direita, como em Porto Alegre, em outros, caminhamos com a extrema-esquerda, como no Rio de Janeiro. Quem é a REDE afinal?


A falta de coesão e projeto claro de sociedade foi responsável pela perda de quadros intelectuais importantes do partido, como o antropólogo Luiz Eduardo Soares. A REDE precisa ser mais que uma reunião de pessoas de boa intenção, é preciso ter um programa claro, capaz de reunir uma base sólida em torno desse projeto. É preciso declarar à sociedade que temos algo de novo a dizer, uma saída real e concreta para a crise civilizatória de nossos tempos. A razão da REDE existir passa por este desafio, do contrário, não tem porque existir. 

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Mais uma chance para a social-democracia

Por Adelson Vidal Alves


A década de 1990 foi emblemática no sentido que interrompeu a experiência histórica do chamado “socialismo realmente existente”, junto com a ela veio uma espécie de demonização do Estado, como sendo um aparelho pesado, obstáculo para o desenvolvimento econômico aos moldes da liberdade de mercado. Nesse sentido, triunfou o neoliberalismo, a receita do Consenso de Washington, desregulamentação, redução do papel do Estado e até flexibilização em direitos trabalhistas. Primeiro no Chile, depois na Inglaterra, o neoliberalismo fez da América Latina o seu continente. O Brasil de Collor e FHC, ainda que em moldes mais “lights” que os de Thatcher e Reagan, também se seduziu pela mão invisível do mercado.

O esgotamento do neoliberalismo no Brasil trouxe ao poder a variante social-democrata brasileira ligada ao sindicalismo. O PT de Lula chegou ao poder proclamando a construção de um desenvolvimento nacional tendo o Estado como indutor, a construção de uma rede de proteção social, a distribuição de renda e geração de emprego. A outra social-democracia se organizou na oposição, e fez um duelo desde então com seu irmão social-democrata na luta pelo poder central. Recentemente o nacional-desenvolvimentismo dos governos petistas perdeu força, e o grande erro do governo petista foi insistir em se manter fiel, na economia, a uma cópia rigorosa dos anos 50. Sem a capacidade de modernização na gestão, o Brasil ficou frágil em seu modelo econômico, vulnerável a crise, que atingiu em cheio o PT, em que o já citado modelo econômico ao lado da crise ética foram os principais motivos que interromperam o ciclo do partido no poder e seu brutal enxugamento nestas eleições de 2016, perdendo quase todas as prefeituras de grande porte que disputou.

A vitória eleitoral deste ano destacou o crescimento de dois partidos de perfil social-democrata: o PSDB e o PPS. O primeiro, aliado do atual governo federal, precisa de uma refundação. Nos últimos anos se inclinou para a direita, absorveu em suas administrações o liberalismo econômico. Caso se reafirme ideologicamente, pode liderar um bloco que seja porta voz desta social-democracia nos nossos tempos, com um projeto reformista, capaz de sustentar um Estado no tamanho ideal para promover o desenvolvimento, diminuir as desigualdades, e democratizar a sociedade brasileira em todas as esferas; econômica, social e cultural.

O PPS – herdeiro democrático do partidão- já em 1991 abandonou perspectivas revolucionárias e se adequou ao reformismo democrático. Mas como bem observou o sociólogo José de Souza Martins, é hoje o mais autêntico social-democrata entre todos os partidos. Também se espera dele uma clareza maior nesta questão, para que decisivamente se credencie como força neste campo da esquerda democrática.


Enfim, as urnas rejeitaram a esquerda histórica, radical e presa a dogmas revolucionaristas, ainda que esta tenha conseguido um crescimento aqui ou lá, mas permanecem pequenos. Nossa tradição histórica social-democrata, cravada na carta de 1988, volta a ganhar força, inclusive para reorientar o governo Temer contra os excessos de ajustes que desconstroem conquistas sociais consagradas na carta cidadã. A social-democracia mais uma vez se mostra o caminho mais desejado pelo povo brasileiro.