quarta-feira, 28 de junho de 2017

Certa despedida

Por Adelson Vidal Alves



Acostumei-me a ser um homem de polêmicas, posições fortes, certos centros políticos. Ocupei a cabeça de movimentos sociais, frequentei os bastidores do poder, ajudei a governar e a impedir governos. Ajudei a consolidar decisões que envolvem meu bairro, minha cidade e meu país.

Hoje, tomei a decisão de repousar. Não quero mais a ponta de nada. Chega de enfrentamentos, chega de liderar posições politicas, chega de me expor como porta voz de uma porção coletiva de opinião. Percebi que as coisas não se decidem nas praças, se decidem nos porões. A política que prevaleceu é a politica do poder dos palácios, não aquela que emana do povo, que se decide nos guetos e nas maiorias. Prevalece o poder econômico, as vantagens, os lucros eleitorais. Os projetos, as ideias, a ética e a moral sempre são subordinados à logica fria eleitoral. Quem quer pensar soberanamente está condenada a solidão coletiva de uns poucos.

Chega de me arriscar e arriscar os outros, chega de gritar dos guetos o óbvio, o que uma minoria medíocre fala das varandas governamentais sempre prevalece. Chega de emprestar minha experiência para que confrarias governem, chega de perder amigos por apaixonadas decisões, chega de se passar por teimosias. Hoje, me converto ao posto mínimo do debate, subordinado a ideias simples e sem microfones poderosos.


Quero escrever, pensar, refletir sem a responsabilidade do concurso, sem ter que culpar, condenar e absolver nas formas frias que a mídia e a vida política nos impõem. Quero a serenidade da política, não mais a então infrutífera luta do poder pelo poder. Enfim, quero ser um simples pensador. 

domingo, 25 de junho de 2017

E se Samuca repetisse Jânio Quadros?

Por Adelson Vidal Alves



Janio Quadros foi eleito presidente da República do Brasil em Outubro de 1960. Foi o primeiro a tomar posse na nova capital, Brasília. O país carregou a esperança na dupla Jan-Jan (Jânio Quadros-Jango), e foi surpreendido com a renúncia do presidente, 7 meses depois de tomar posse. Jânio teve problemas para governar no Congresso, hegemonizado pela dupla PSD/PTB, e se meteu em assuntos pequenos, como a proibição do uso de biquíni e a prática de briga de galos. Encurralado por sua ingovernabilidade, anunciou renuncia acreditando que o país lhe daria mais poderes, um cálculo errado que lhe custou o mandato e a posse de Jango.

De Brasíla da década de 60 para a Volta Redonda do século XXI. O prefeito da cidade está bem longe de um experiente e histórico Jânio Quadros, mas também vê seus poderes se dissolverem na conjuntura política. Samuca já tem seu nome envolvido em especulações sobre sua renúncia, pelo menos são os boatos que correm nos corredores do poder. Mesmo que tal hipótese jamais tenha passado na cabeça do prefeito, o fato é que a situação preocupa e muito. Há quem garanta que o jovem “gestor” eleito não suportará as pressões que vem da política e da delicada situação econômica do município e da prefeitura. É publicamente admitido que não há dinheiro nos cofres públicos para dar aumento aos servidores e ao mesmo tempo manter os serviços públicos em bom funcionamento. Pior, ele sabe que não conseguirá pagar a folha salarial em dia até o fim do ano. A confiança que trouxe consigo na base do marketing e da fama de outsider evaporou-se na sua própria ineficiência e pouca habilidade política.

Jânio Quadros renunciou com 7 meses de mandato, por que Samuca não poderia fazer o mesmo?

Pode, e há quem defenda isso, dentro e fora do governo. Mas é improvável que isso aconteça, seja pela teimosia do prefeito, seja pela vaidade que tem. Fato importante também é a maioria parlamentar que adquiriu recentemente, a custa da velha negociata dos balcões de negócios da política, e também por deter significativa influência na mídia, o que lhe dá certa reserva de governo, que só será abalada caso a realidade econômica não melhore.

Mas caso a situação piore e empurre Samuca para uma renúncia, Volta Redonda pelo menos voltará a uma normalidade política, descontaminada da “pós-verdade” do período eleitoral e dos primeiros meses de governo. Ao contrário do caso Jânio, contudo, está o problema da sucessão. Bem diferente de um João Goulart, o que esperaria a cidade do aço seria o ambicioso empresário Maycon Abrantes, que não tem qualquer talento político e muito menos ligações com alguma base popular. Um futuro governo Maycon seria a consagração da “República dos empresários” já em gestação com Samuca, mas de forma desastrada. O fato inconteste do momento é que aos poucos o governo municipal perde apoio popular e se enrola na sua pouca capacidade administrativa.

Dificilmente Samuca encerrará seu mandato, lhe faltará governabilidade, e ai então teremos que conviver, ou com algum dispositivo de destituição legal, como impeachment, ou com uma provável renuncia. Nenhum dos dois quadros são animadores, Volta Redonda seguirá nas mãos do amadorismo inescrupuloso, é o preço de se votar com pura paixão e sem consciência. 

terça-feira, 20 de junho de 2017

“É a economia, estúpido!”

Por Adelson Vidal Alves



“É a economia, estúpido!” A frase é do marqueteiro James Carville, assessor do então desconhecido governador de Arkansas, Bil Clinton, candidato a presidência dos EUA em 1992, contra George Bush, que acabara de vencer a Guerra do Golfo. Carville estava certo que a recessão e a fraca economia americana naquele momento dificultariam a vida de Bush.

Deixando nosso vizinho do Norte e aterrissando na cidade do aço Fluminense, Volta Redonda, podemos entender um pouco melhor a frase de James, em outro contexto, é verdade, mas com muita atualidade. Não falemos de eleições, por enquanto, falemos de governo. O prefeito eleito da cidade, Samuca Silva, tem diante de si um desafio e tanto: fazer a economia da cidade crescer e gerar seus frutos. Do contrário, corre o risco de sequer concluir o mandato.

O jovem “gestor” (com todas as aspas possíveis) apostou em um carisma que não tinha, e mal conseguiu montar uma política de governo. Cooptou 19 dos 21 parlamentares da cidade, escolheu a dedo alguns veículos de imprensa, se apoiou nos empresários e se arriscou construir uma governabilidade pelas redes sociais. No inicio, até que deu certo. Segundo pesquisa Orbital, os primeiros 100 dias de administração Samuca tiveram aprovação de mais de 50% da população. Samuca, ainda, conseguiu sepultar eleitoralmente seu maior adversário, o ex-prefeito Neto, reprovando suas contas na Câmara dos vereadores. No entanto, sua fraca assessoria não conseguiu detectar que o marketing e a política são mediações dialéticas junto à opinião pública de um aspecto decisivo na vida de qualquer governo, a economia.

Hoje (20/6) o prefeito voltou a imprensa para chorar as dívidas deixadas por seu antecessor, chegando a levantar a hipótese de que faltará salário aos servidores logo-logo. Uma ação desesperada e inútil. Não terá efeito apenas transferir a culpa, a população quer resultados. Quer emprego, saúde, desenvolvimento urbano e social, inovações políticas, educação de qualidade, concurso público, melhoria nos serviços prestados. Nada disso se consegue sem que a economia esteja em alta; e Samuca seria de uma ingenuidade tosca se acreditasse que o “Ruas de compras” sozinho poderá alavancar algum número positivo e relevante em nossa economia.

É preciso retomar o crescimento! Cortar gastos, redirecionar investimentos, assumir parcerias público e privadas, negociar novos contratos, realizar uma dura reforma administrativa e fiscal, demitir cargos comissionados. Caso a política econômica de Samuca siga tão pobre e desorientada como está, o risco de falência da prefeitura é grande. Servidores ficarão sem salários, fornecedores interromperão seus trabalhos, politicas sociais serão cortadas, empregos desaparecerão, serviços perderão qualidade, faltarão médicos, professores, assistentes sociais.


Quando chegarmos a esse ponto, o governo não terá mais seus 19 vereadores, a imprensa chapa branca vai virar oposição, os aliados irão pular fora, a sociedade irá às ruas. E ai então será o fim trágico de um aventureiro que mal conseguiu se equilibrar no poder, pois não entendeu os fundamentos de uma governança complexa. Nesse momento, certamente terá a lembrança da famosa frase de Carville: “É a economia, estúpido!”. 

sexta-feira, 16 de junho de 2017

O fim do domínio do Homo Sapiens

Por Adelson Vidal Alves



A ideia de que os seres humanos tomam suas decisões de forma livre é falsa. Na verdade, somos simples algoritmos e não existe um “Eu” individual dentro de nós, nossas escolhas são tomadas por sequências de atos que acontecem no nosso organismo. Essa é uma das ideias defendidas pelo historiador Yuval Noah Harari no seu livro Homo Deus: uma breve história do amanhã.

O autor faz outras tantas afirmações sobre o nosso futuro, algumas positivas, outras, nem tanto. Para Harari, o desenvolvimento cientifico foi capaz de vencer a fome e tantas doenças que em outros tempos quase dizimaram a humanidade. Além disso, a engenharia genética e outras ciências serão capazes de manipular o organismo humano a ponto de não existir mais morte e nem tristeza. Um sonho.

Por outro lado, poderemos virar uma simples espécie nas mãos da tecnologia, o domínio do Homo Sapiens estaria chegando ao fim. Imaginem que escolher um casamento, o prato do dia ou o programa do fim de semana dependerá tão somente do processamento de dados de um programa como o Google, que antes de nós, já saberia o que seria melhor para nós mesmos. Somos algoritmos, e como tal, bastariam algumas informações para que outros algoritmos tecnológicos decidam pela gente o que fazer. Na hora de votar, nada de reflexões longas na boca da urna, um simples programa de computador analisaria tudo o que você pensou nos últimos anos e apontará o candidato que combina mais com você. Ele te indicará o nome, você só terá o trabalho de confirmar a escolha do algoritmo.

Mais: homens motoristas não existirão. Um veículo programado será capaz de te levar em segurança até seu destino, sendo capaz de prever em qual rua virar para não pegar trânsito, a velocidade certa de andar, e o momento exato do freio. Nada de acidentes, multas de trânsito e engarrafamentos. As máquinas do futuro serão capazes de rapidamente processar informações que humanos errantes não conseguem fazer a tempo de evitar problemas que nos atormentam no cotidiano da vida. Os médicos também cederão seus consultórios para programas de informática, que em minutos analisarão dados do seu corpo e de sua alimentação dando um diagnóstico infinitamente mais preciso que os constatados por médicos humanos. E aquela reunião de negócios? Como se comportar? O que dizer? Um aparelho instalado no seu corpo vai avaliar sua pressão sanguínea, sua adrenalina e te apontar se você deve ou não fechar um negócio, falar ou ficar em silêncio no encontro. Incrível, não?

Todas essas possibilidades não são apenas ficção. Ao contrário, muitos programas e pesquisas elaboradas por grandes grupos econômicos já apontam nessa direção. Pelo que tudo indica, o Homo sapiens não será mais o grande dominador, seríamos apenas uma peça de manipulação nas mãos da inteligência artificial.

Resta ainda saber o que faremos quando os empregos desaparecerem, quando elites humanas poderão criar super humanos. Como ficará a política, a democracia, o processo educacional? Para Harari, as ciências biológicas darão conta de resolver tudo isso, afinal, somos apenas algoritmos produzidos pela seleção natural. Aqui mora, talvez, seu grande defeito: o determinismo biológico. Ainda sim, sua tese de que o futuro pode sim nos subordinar a nossa própria tecnologia é algo real. O tempo nos dirá o quanto ele está ou não certo em suas previsões.


segunda-feira, 12 de junho de 2017

A PM tem que acabar e todo mundo sabe disso

Por Adelson Vidal Alves



Pesquisa recente intitulada “Modernização da Segurança Pública", realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV DIREITO SP) e a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), apontou que mais de 70% dos policiais apoiam a desmilitarização da Polícia. O fim da PM, que está incluída em uma PEC que tramita no senado, é vista pela sociedade como algo que poderia harmonizar as ações da Polícia junto ao anseio da população por segurança pública, dentro dos limites e valores que emanam de um sistema democrático e republicano.

A Polícia Militar brasileira ganhou ares institucionais no período mais intenso de repressão dentro do regime militar. De forma lamentável, sua existência foi mantida pela carta constitucional de 1988, figurando uma das mais tristes heranças da ditadura que permaneceram na nossa Constituição. Na prática, isso significa que em nossa estrutura de segurança pública segue existindo um órgão policial de cultura militarista, isto é, agindo na sociedade com espírito de guerra, pronta para tombar o inimigo. Na “tropa de elite” desta PM, vigora um treinamento nos quais policiais celebram a missão da instituição: “Subir favela e deixar corpo no chão”, a exaltação do crime de execução extrajudicial.

Além disso, a PM brasileira age sob uma lógica preconceituosa, de cor e de classe. As principais vítimas letais do órgão são negros e pobres, dentro de uma estatística que escandaliza pelo número de mortes que nasce do cano do revolver de um policial, e também contra policiais. A lógica da guerra faz a Policia matar e morrer.

Outro aspecto a ser levado em conta na defesa do fim da PM tem a ver com o próprio funcionamento policial como um todo. Hoje, temos dentro da PM duas polícias, os chamados “praças” e os chamados “oficiais”. Os primeiros penam uma hierarquização anacrônica que promove humilhação, e faz da patente uma fonte de legitimação para esculhambações perversas e cruéis ao subordinado.

Falemos também do trabalho policial fragmentado. Temos hoje a PM que sobe favelas para enfrentar o tráfico, enfrentar turbulências sociais, enquanto a Policia Civil investiga. Por que não centralizar em uma única polícia o trabalho ostensivo e investigativo? É preciso, também, criar mais núcleos especializados. Um PM que separa briga de casal ou reprime um bêbado que incomoda transeuntes pode ser o mesmo que no dia seguinte enfrentará traficantes armados. Como fica a cabeça desse policial?


É preciso reformar, unificar e desmilitarizar a Policia. Modernizar a ação policial, tornando-a mais eficiente e em acordo com os direitos humanos e os parâmetros democráticos. Ganha a sociedade, as pessoas e, principalmente, os policiais. 

segunda-feira, 5 de junho de 2017

Design Inteligente, a farsa do criacionismo

Por Adelson Vidal Alves



Houve tempo em que vivemos imaginando ser o Planeta Terra o centro do universo e que o sol girava em torno dele. O ser humano seria um ser especial, dotado de um plano cósmico carinhosamente preparado por um criador cuidadoso e perfeito. Com o advento da ciência moderna, descobrimos pasmos que a Terra gira em torno do sol, que na imensidão do universo nosso planetinha é uma poeira cósmica insignificante, e que o ser humano é apenas parte de uma cadeia evolutiva que envolve igualmente toda a vida que encontramos por aqui. Um golpe quase mortal na religião.

Diante da nova realidade, muitos aceitaram as descobertas científicas e readaptaram seus pensamentos, ou simplesmente ignoraram a ciência, afinal, a religião tem o papel de nos dar direção moral e apontar caminhos de salvação eterna, não para explicar porque ficamos gripados ou morremos, deixem isso para os cientistas. No entanto, há quem batesse e bata o pé recusando a acolher a teoria da evolução, o Big Bang, a datação da Terra em 4,5 bilhões de anos. Para essas pessoas, a espécie humana sempre foi exatamente como é hoje, o Planeta Terra tem no máximo 10 mil anos e o Big Bang tão somente o momento da criação narrada com detalhes na bíblia. O pior, fazem tais declarações jurando estarem em acordo com o conhecimento científico.

Os criacionistas ou fixistas, como ficaram conhecidos os grupos que fazem tais colocações, tentaram reunir falhas na teoria da evolução, e demonstrar que o conhecimento científico construido até hoje está lá nas páginas do Gênese, o primeiro livro da bíblia que narra a lenda de Adão e Eva. O esforço foi tão ridículo que até entre os setores religiosos o chamado “criacionismo científico” perdeu respeito, era apenas o forçar de barra de pseudo-cientistas como o cômico físico brasileiro Adauto Lourenço, que jura ter provas que a arca de Noé existiu e que o Homo Sapiens conviveu com os dinossauros.

O contra-ataque criacionista, todavia, apareceu recentemente, e responde pelo nome Design Inteligente (Desenho Inteligente), com uma proposta aparentemente mais sofisticada e que goza do apoio de cientistas renomados, como o bioquímico norte-americano Mchael Behe, autor de “A Caixa Preta de Darwin”.  Segundo esta “teoria”, o planeta, o cosmos e a vida apresentariam uma ordem e complexidade que só poderia ter sido desenhada por uma mente inteligente. Não é preciso ter um grande Curriculum Lattes em ciência para saber que não passa de um truque fajuto do criacionismo, bem longe do conhecimento científico.

O método científico inicia-se com um objeto de pesquisa, depois se colhem informações, dados, provas, observa-se e então elabora-se hipóteses, testadas por várias vezes até uma conclusão razoável, sempre provisória, pois na ciência, ao contrário da religião, o aparecimento de novas evidências vai obrigar cientistas a reverem tudo que até então tinham como certos.

O Design Inteligente faz o caminho inverso. Ele já parte da constatação da existência de um criador inteligente, caberia à ciência apenas revelar a grandiosidade de sua criação. Para isso, reúnem-se dados matemáticos, físicos, genéticos e científicos que deixariam claro o quanto o mundo e a vida são complexos e ordenados, algo que não poderia vir do acaso, mas sim de um planejador consciente.

A farsa do DI, obviamente, não tem respaldo na Academia. Um pesquisador que se arrisca a apoiar tal hipótese colocará sua carreira em jogo. Mas eles seguem existindo, sobrevivendo em faculdades confessionais, como a Mackenzie, em publicações “científicas” de Universidades americanas e afins, gozando até de espaço generoso na mídia.

Para a ciência séria, a evolução é o único modelo explicativo da vida e do universo, e não se prestará a competir com nenhuma outra teoria que não goze de alguma credibilidade científica. Pode ser que apareça, mas por enquanto, ir contra o evolucionismo é ir contra a boa ciência. O DI é a farsa do criacionismo num disfarce mequetrefe e patético.