segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Por que Deus não vai embora?

Por Adelson Vidal Alves



Uma das hipóteses antropológicas para o surgimento da religião está no impacto do desconhecido sobre nossos ancestrais primitivos. Um raio que corta o céu, um companheiro que dorme e nunca mais acorda (morte) e até mesmo os sonhos podem ter sugerido ao homem primitivo - sem nossos conhecimentos modernos- a existência de uma realidade fora do mundo que enxergavam. O encantamento do desconhecido talvez tenha levado os primeiros humanos a venerarem o que não podiam explicar, criando as bases para o que mais tarde viriam a ser as religiões.

Tal tese pode explicar a origem dos primeiros sinais de fé religiosa entre nós, mas não pode esclarecer por que hoje, milhões de anos depois e com tanto conhecimento acumulado, seguimos acreditando em seres divinos.

O astrofísico Stephen Hawking em recente Conferência declarou que “o Universo não precisa de Deus para existir”. Segundo o renomado cientista, o conhecimento científico já tem elementos suficientes para dispensarmos do cosmos a necessidade de um criador para ele. Tudo poderia ser explicado pelas leis da física.

De fato, a ciência moderna desvendou grande parte do que então era considerado mistério. A origem da vida, a construção da ordem planetária, o funcionamento do corpo humano e a maioria dos fenômenos naturais estão bem explicados, dispensando a necessidade de qualquer ser metafísico agindo do seu mundo celestial. Então voltamos a perguntar: por que Deus segue entre nós? Por que os templos religiosos seguem lotados? Por que a maioria das pessoas segue acreditando em uma entidade sobrenatural que governa o mundo?

As tentativas de respostas vem de todos os lados. Para o médico americano Andrew Newberg, autor do livro Why God Won’t Go Away (“Por que Deus não vai embora”, sem tradução em português), a espiritualidade faz bem a saúde e teria sido fundamental em nossa autopreservação. O cientista usou de tomografia em cérebros religiosos, como os de freiras católicas e monges budistas, e conseguiu mapear a neurologia de suas meditações e experiências místicas. O resultado sugere que no nosso cérebro estaria uma espécie de “programa que nos faz viver a espiritualidade”.  Resta saber se foi Deus quem inventou nosso cérebro ou se foi o contrário.

Pensadores em todos os tempos também se debruçaram sobre a questão divina. O pai da psicanálise, Sigmund Freud, disse que a crença religiosa é uma neurose. Friedich Nietzsche, Bertrand Russel, David Hume e outros, também abordaram o tema, sempre em tom crítico. Destaque para o filósofo alemão Karl Marx, que em sua abordagem antropológica defendeu a religião como a expressão da “consciência alienada”, fruto da divisão social do trabalho promovida pelo capitalismo. Segundo o materialismo histórico marxista, a religião teria bases materiais, e só poderia deixar de existir quando tais bases desaparecessem, ou seja, quando o capitalismo deixasse de existir.

Enfim, é de fato um paradoxo que tenhamos evoluído tanto na tecnologia, na medicina e no conhecimento científico e ainda sigamos buscando milagres, acreditando em eventos extraordinários, em possessões demoníacas ou coisas do gênero. Esperávamos que nos dias de hoje o ser humano já fosse capaz de tomar o seu destino nas mãos, e não transferi-lo para seres de outra dimensão. Que respondêssemos nossas dores e dilemas com respostas racionais, e não com credos rudes. Talvez nossa carência existencial não nos deixe assumir a autoconfiança de que somos os verdadeiros donos do planeta, e que somos nós quem decidimos nosso futuro, não um estranho ser controlador, que depois de milhões de anos de história, nunca deu sinal de que de fato poderia nos fazer falta.


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