segunda-feira, 14 de agosto de 2017

O uso cretino da palavra democracia

Por Adelson Vidal Alves



Hoje quase todo mundo se diz defensor da democracia. É impensável imaginar que nos nossos dias alguma força política vá abertamente defender a supressão de liberdades ou condenar o sufrágio universal. Mesmo o deputado Jair Bolsonaro, admirador confesso da ditadura militar, prefere disfarçar seu apreço pelo autoritarismo dizendo que o Golpe civil-militar de 1964 foi na verdade a salvação do Brasil de viver um regime comunista, exatamente o mesmo discurso dos golpistas da época. Além disso, busca evitar o termo “Ditadura militar”, colocando em seu lugar “Regime militar”, e costuma dizer que os militares defenderam a democracia, assim como ele defende.

Mas o deputado não está sozinho neste uso cretino da palavra democracia. Na esquerda há também quem pose de democrata só quando os seus interesses são atendidos ou pretendem ser atendidos. Para estes, foi necessário defender Dilma do impeachment, não para defender a ex-presidente, mas para “proteger a democracia brasileira”. Os mesmos defendem hoje a Assembleia Constituinte golpista de Maduro, dizendo que a burguesia venezuelana estaria dando um golpe, quando está claro que a abolição do sufrágio universal e as manobras para redigir uma nova Constituição são visivelmente manobras golpistas do governo chavista.

Democracia para esta gente não é o sistema político das liberdades, da participação popular no exercício do poder, da resolução pacífica dos conflitos sociais e a socialização da vida econômica, cultural e política. Para eles, a democracia só é democracia quando se atende interesses exclusivos de um grupo, classe ou partido. Quando tais interesses são contrariados, vale quebrar a regra do jogo e ainda classificar tal ruptura como defesa da democracia.

Só que o sistema democrático pensado nos termos da teoria do Estado democrático de direito é uma conquista de civilização, modelo de sociedade no qual as liberdades são respeitadas e o pluralismo uma lei que atende a realidade complexa do mundo contemporâneo. Não se aceita a supremacia de um grupo pelo uso da força.

Viver democraticamente é reconhecer que a sociedade humana tem diferenças, é aceitar fazer concessões em nome de um bem comum, é construir consensos cada vez mais universalistas, é respeitar a diversidade de ideias e ao mesmo tempo lutar para que caminhemos cada vez mais para uma solução comum nas nossas grandes questões.

A democracia é um valor universal, não um instrumento a ser utilizado e depois descartado quando objetivos particulares são atendidos. É dentro dela, com ela e por ela que as sociedades devem amadurecer e aperfeiçoar a convivência em direção a um mundo pacífico e justo.


É nestas condições que a palavra democracia deve ser usada, e não no tom cretino que esquerda e direita resolveram usá-la para seus fins próprios. 

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