quinta-feira, 22 de setembro de 2016

O futuro da África e o neo-racismo científico

Por Adelson Vidal Alves



A ideia de hierarquia racial é antiga. O grande filósofo grego Aristóteles já falava na superioridade da “raça helênica”, que seria dotada de espírito e inteligência diferenciados, o que a colocaria em patamar elevado na arte de governar. Entretanto, a ideia de racismo a partir da ciência teve origem somente com a publicação de Ensaio sobre a desigualdade das raças humanas, do aristocrata francês Arthur de Gobineau, na segunda metade do século XIX.  Gobineau defendia que a história da humanidade se construía a partir da dinâmica das raças, que seriam três: branca, negra e amarela. Apesar da roupagem científica, as teses do aristocrata combinavam com suas interpretações literais da bíblia, o que o fez afirmar que a raça branca teria origem em Adão, conforme estaria narrado nas escrituras.

Depois de Gobineau vieram outros “cientistas” que atestavam haver razões para classificarmos os seres humanos em raças hierárquicas. O resultado todos nós conhecemos. Surgiram movimentos racistas e governos de segregação racial, que teve seu ápice na Alemanha nazista, que em sua ideologia, sonhava eliminar  as “raças inferiores à família ariana”. Somente na década de 1970 que a genética praticamente deu sentença oficial quanto a não-existência de raças humanas, a partir de estudos do biólogo americano Richard Lewontin, da Universidade Harvard, mais tarde confirmadas e aperfeiçoadas por outras pesquisas de renomados pesquisadores.

Todavia, a polêmica das raças está longe de ter sido superada, não só pelo seu uso persistente em políticas públicas, mas até mesmo na área das ciências da natureza. Em 2oo7, o Nobel de medicina James Watson declarou ao jornal The Sunday Times " ser pessimista sobre a África porque as políticas ocidentais para os países africanos eram, erroneamente, baseadas na presunção de que os negros seriam tão inteligentes quanto os brancos quando, na verdade "testes" sugerem o contrário”. A declaração chocou a comunidade acadêmica, e Watson perdeu empregos e foi desconvidado de palestras que iria ministrar. O fato, aparentemente isolado, não foi o único a desafiar o consenso científico na questão das raças. Em recente livro, intitulado “Uma Herança Incômoda”, o jornalista britânico Nicholas Wade reaviva teses do racismo científico ao afirmar que a evolução humana produziu sim raças inferiores e superiores, que teriam sido formadas graças ao isolamento de “raças” em espaços geográficos diferentes, que através do ambiente, interferiria na formação genética racial. E mais, ainda segundo o autor, a diferença biológica de tais grupos explicaria comportamentos e o desenvolvimento de nações e continentes. A África seria, então, um continente fadado ao fracasso, graças ao perfil genético de seus habitantes, determinados a não terem bom convívio, diferente da Europa. Trata-se da sistematização teórica da fala de Watson.

A questão vai além do racismo, adentramos novamente no debate cultura versus biologia. Afinal, seríamos nós o que define a biologia ou seríamos produtos das influências culturais? Se optarmos pelo primeiro, poderíamos sim dizer que pessoas tenderiam a ser psicopatas por conta de sua composição genética, a natureza determinaria os gênios e os estúpidos. Óbvio que muito do nosso comportamento parte do DNA, mas desconsiderar por completo a influência do ambiente no individuo soa como um determinismo biológico sem fundamento.
A situação social da África não é fruto da ditadura genética, mas da história de exploração que o continente sofreu. O imperialismo do século XIX dividiu o continente entre os europeus, que saquearam suas riquezas e deixaram marcas cruéis de destruição que se estendem aos dias de hoje.

As políticas públicas em prol do continente africano fracassam não pela defasagem de inteligência dos negros, mas por que elas não vem acompanhadas de medidas verdadeiramente estruturais, como o perdão definitivo das dívidas dos países africanos para com as nações ricas. Sem falar nos problemas internos do continente, que acumula guerras civis e verdadeiros massacres étnicos.

A grande lição de todo esse debate é que o futuro da África não depende dos laboratórios, e nem de correção genética, mas de uma efetiva política global que restabeleça o equilíbrio social, cultural e econômico, afetado por anos de colonização branca.







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