Por Adelson Vidal Alves
O que é História? Marc Bloch
responde: “é a ciência dos homens no tempo”. Qual seu objeto de estudo? O mesmo
Bloch esclarece: “O objeto de estudo da História, é por natureza, o homem”.
O historiador francês, fundador
da Escola dos Annales - esta que revolucionou a metodologia historiográfica no
inicio do século XX - nos deixa claro que o papel do profissional de história
não é simplesmente vasculhar o passado e depois despejá-lo na sociedade em
forma de cronologia e verdade absoluta. Mais que isso “História é ciência do
passado e do presente, um e outro, inseparáveis” (Fernand Braudel), e o
conhecimento que nasce da pesquisa historiográfica é sempre uma interpretação
do historiador, ainda que seguindo uma metodologia.
A “história da História” revelou
rupturas e permanências na ciência histórica. Passamos, graças a já citada
Escola dos Annales, de uma história factual, concentrada em heróis, datas, grandes acontecimentos políticos e com ênfase quase
que exclusiva em documentos escritos; para uma concepção problemática, que
valoriza diversas fontes, dialoga com outras ciências e entende ritmos
diferenciados no tempo da História. Aqui, revela-se uma história que não é
uma narrativa absolutamente “verdadeira” dos fatos, mas um objeto de disputas, de construção
de imaginários que representam a hegemonia de um grupo ou de outro na criação
da “História oficial” ou da "História que venceu". A memória da sociedade, assim, está subordinada a
uma luta intensa pela hegemonia de uma “versão” da História, escrita conforme a
visão de mundo de um grupo. A História, desta forma, jamais é absolutamente
neutra.
Diante destas disputas, disse
bem Fernand Braudel, em acordo com as varias citações aqui mencionadas, que “a
função do historiador é lembrar a sociedade do que ela quer esquecer”. Isto é,
provocar o homem e a sociedade quanto ao fato que passado e presente se
interlaçam em uma aventura construída pela ação dos homens no mundo e na
natureza. Memória significa poder.
Desta forma, percebemos que nos
tempos atuais é de fundamental importância a formação de espaços múltiplos de
disputas da memória. O lugar natural destas disputas é a academia, lá se constrói
o conhecimento histórico como ciência. No entanto, este debate não pode se
resumir ao campo acadêmico, um campo que, pelo menos no Brasil, tem grandes
dificuldades de conversar com o povo, com as pessoas comuns.
O poder público, no âmbito das
políticas públicas de cultura, pode e deve incentivar espaços que envolvam
diretamente o cidadão comum no “fazer história”. São bibliotecas, centros de
memorias, arquivos, fundações culturais, acervos populares, lugares onde a
história não é só conhecida, mas também revista, construída e desconstruída,
criticada, questionada ou entendida, tudo através da intervenção popular com utilização de diversas ferramentas. O fornecimento de espaços de memória do poder público para
a sociedade, sempre em contato com a academia, configura-se como a
democratização das falas da História, setores marginalizados não se desmancham
em meio aos eventos espetaculares da vida, mas se somam e problematizam.
O Estado tem condições de
ajudar a formarmos um universo plural e democrático no debate da História,
junto com a população. Basta aceitar investir em tais propostas como sendo
investimento no patrimônio material e imaterial de cada povo. Unidos, sociedade,
universidade e poder público podem ajudar na vivência da construção pluralista da História.
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