segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Os pobres são de direita? Resposta a Paulo Moreira

Por Adelson Vidal Alves



Os pobres são de direita? Segundo o colunista do Diário do Vale, Paulo Moreira, a resposta é sim. Para Paulo, pobre aprova a redução da maioridade penal, a pena de morte e é contra a intervenção estatal na economia e o desarmamento da população civil. Suas afirmações não vêm acompanhadas de nenhuma pesquisa ou dado estatístico que as comprovem, a não ser pelo resultado do plebiscito do desarmamento realizado no Brasil em 2005. Mesmo aqui, o autor do artigo comete um erro grave: o de desconsiderar o pluralismo da esquerda.

Não podemos falar de “esquerda”, mas de “esquerdas”. No citado plebiscito, partidos e movimentos de esquerda se posicionaram contra a proibição do comércio de armas e muitos da direita apoiaram a restrição. O PSTU se posicionou afirmando que a consulta popular era uma forma de desarmar o proletariado em período de crise revolucionária. Organizações e intelectuais de direita também não foram homogêneos em suas posições, direitistas afirmavam que arma na mão de gente ignorante poderia significar o aumento de assaltos e incentivaria a bandidagem. O fato é que não podemos ser superficiais quanto ao debate esquerda x direita, devemos saber que ambas mantém variantes dentro de si. Podemos falar de extrema-esquerda, esquerda democrática, esquerda revolucionária ou reformista; da mesma forma vamos enxergar uma direita democrática, moderada, assim como fascista e autoritária.

A fim de evitarmos mais confusão, trataremos aqui desta distinção aos moldes de Norberto Bobbio, isto é, a direita naturaliza a desigualdade e a esquerda entende que as desigualdades são produto de um sistema social injusto, no qual a política poderia interferir para amenizar.
A partir disso, vamos constatar simplesmente que não existe um lugar natural do pobre no campo ideológico. Pobres assumem decisões de acordo com o que interpretam no momento, ou quando assumem para si consciência de classe. Basta entendermos o que explica o marxismo nos conceitos de “classe em si” e “classe para si”. O primeiro representa o momento no qual a classe existe empiricamente, como realidade concreta de um determinado modelo econômico, já a “classe para si” se encontra em um momento evoluído onde se reconhece dentro de um determinado modelo de produção; entende os prejuízos e vai para a luta. No capitalismo, seria muito difícil entender um trabalhador que reconhece sua pobreza e resolve defender a direita, seria uma tomada avessa de consciência. Neste estágio de conscientização, é impossível um pobre ser de direita.

Sem compreender estas questões básicas, o autor parte para o ataque contra a esquerda. Ele a vê como o lugar de intelectuais que gostam de trabalhar pouco no serviço público - os “pequenos burgueses”-  ou simplesmente professores que seriam contra a meritocracia na educação. Paulo Moreira revela aqui que quem é de direita não são os pobres, mas sim ele. Uma cabeça que se ponha contra as desigualdades entenderia a crítica que se faz á meritocracia. Colocar estudantes de níveis sociais e cognitivos diferentes em disputas que partem do mesmo ponto é de uma injustiça cruel. Não considera que o Joãozinho filho de desempregados e que trabalha durante o dia vendendo bala no metrô não pode concorrer de igual para igual com o playboyzinho da Zona sul. E para se chegar a essa conclusão nem precisamos recorrer aos teóricos revolucionários do marxismo e da esquerda, basta uma lida rápida em John Rawls, um liberal confesso.

Marx certa vez viu uma real possibilidade revolucionária no sufrágio universal. O filósofo imaginava que sendo os pobres a maioria logo conseguiria tomar o poder, o que obrigaria a burguesia a recorrer à repressão. Mas Marx estava enganado, o capitalismo se desenvolveu e criou camadas médias, concedeu ganhos econômicos aos trabalhadores, e o Estado moderno conseguiu suprir necessidades emergenciais dos grupos mais excluídos. As eleições e a luta de classes, então, passaram de uma leitura meramente economicista para uma preocupação no campo das ideias, dos sentimentos, da cultura. A batalha pela hegemonia, nos termos gramscianos, é exatamente isso, a disputa para construir novos consensos, e assim moldar uma sociedade mais justa. Não é que o pobre “é de direita”, ele pode “estar de direita”, mecanismos de persuasão como a escola, os partidos e a família podem ser decisivos na hora de sabermos se ele irá de Bolsonaro ou de Zé Maria, de Heloisa Helena ou João Dória, de MST ou UDR, de CUT ou Fiesp. Generalizar um grupo social com um único e imóvel  viés ideológico é um erro panfletário que Paulo Moreira Leite cometeu.


PS: Caro Paulinho, o professor é contra elaborar provas não porque tem preguiça de corrigir, mas porque essas avaliações não tem sentido algum, assim como todo o sistema escolar atual. 

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